A Associação da Hotelaria de Selva da Amazônia Brasileira (AHSAB) foi fundada no dia 3 de março deste ano. Pouco tempo depois, o Hôtelier News conversou, ao mesmo tempo, com alguns de seus membros. O teor da entrevista, como o leitor verá a seguir, foi brindado pelo amor aos negócios, atenção à responsabilidade com o meio ambiente e regularização e fortalecimento do setor, considerado o mais delicado de toda a hotelaria, ainda mais quando os empreendimentos em questão estão instalados no seio da Floresta Amazônica, palco de infindáveis belezas, mas também de fortes lutas sociais e ambientais travadas entre quem a destrói e quem a protege.  
 

Além das razões acima citadas, a associação nasceu “com o objetivo de desenvolver e estabelecer parâmetros para o melhor desempenho sustentável de seus hotéis e empreendimentos filiados, envidando esforços em prol de um interesse comum: o desenvolvimento econômico e sustentável de suas empresas e da Amazônia”, como é dito em seu site. 

“É um caminho muito longo, mas já começamos a andar”, afirma Peter Tilanus, presidente do Tiwa Amazonas Ecoresort e do conselho deliberativo da Associação.

 

A conversa aconteceu em uma sala do hotel Tropical Manaus e contou com a presença de Tilanus; Sérgio Carvalho, diretor-presidente-executivo da AHSAB; Sofia Takase, gerente comercial do Juma Lodge; Paulo Saldanha, do Pakaas Palafitas Lodge; Paulo Augusto Fiusa Filgueira, procurador do Rio Negro Lodge, e José Gilson do Nascimento Garantizado, gerente financeiro da Negrotur Turismo.

Augusto Costa, do Anavilhanas Lodge, não pode participar, mas enviou suas respostas por e-mail. As palavras em destaque, ao longo do texto, foram tiradas do site da Associação que, aliás, recebeu 1323 visitas em 45 dias de funcionamento – fato comemorado por todos.

 

Por Karina Miotto, de Manaus

 


Paulo Saldanha, Peter Tilanus, Sofia Takase,
Sérgio Carvalho, José Gilson e Paulo Augusto Fiusa

 

Hôtelier News: Por que vocês aderiram à Associação?

Peter Tilanus (Tiwa): Pelo amor ao negócio, boa vontade dos envolvidos e nível de amizade que temos. Sabemos que o setor está em desenvolvimento e que nem todos seguem algumas normas. Por causa disso criamos, inclusive, um código de ética. Particularmente, acho bonita nossa atitude de levantar a associação.

 

“O estabelecimento de um Código de Ética para suas empresas associadas de forma a regular a conduta moral e profissional e indicar normas que devem inspirar o exercício das atividades profissionais e empresariais, é matéria de alta relevância para o exercício profissional”

 

Paulo Augusto (Rio Negro Lodge): O setor está carente de organização e esta é uma tentativa de agregá-lo. Com esta união, saberemos separar o joio do trigo. O amor ao negócio é fundamental.

 

Augusto Costa (Anavilhanas Lodge): Nós sempre acreditamos que o destino Amazônia nunca foi trabalhado à altura do seu potencial. Qualquer iniciativa capaz de influenciar positivamente a divulgação da Amazônia como um destino merece ser apoiada. O turismo responsável é, sem dúvida, um dos maiores aliados para a preservação de áreas florestais como a Amazônia.

 

HN: Como ela beneficiará a hotelaria de selva?

Paulo Augusto (Rio Negro Lodge): Pontuaremos as dificuldades e interagiremos com órgãos oficiais que, muitas vezes, não enxergam questões reais e pontuais.


Paulo Augusto, do Rio Negro Lodge

 

Paulo Saldanha (Pakaas Palafitas Lodge): Enfim, vamos formular propostas para melhorar este setor.

 

Augusto Costa (Anavilhanas Lodge): A associação nasceu com o intuito de fortalecer o segmento. A Amazônia é uma região muito vasta e diversa, com pequenos hotéis diferentes trabalhando sem representação ou apoio justamente por não ser fácil conversar com pequenos atores. Uma vez criada e sedimentada uma associação que represente a hotelaria de selva, pequenos e médios empreendimentos passarão a ter um espaço antes vago por falta de organização.

 

Peter Tilanus (Tiwa): Queremos ser exemplos de como atuar neste mercado ainda pequeno no Brasil, se o compararmos com outras regiões do país e do mundo. É um caminho muito longo, mas já começamos a andar. Captaremos dinheiro para desenvolver o produto e negociar com o mercado. Seremos um ponto de informações sobre a hotelaria de selva.

 

“Desenvolver estudos e pesquisas que identifiquem o setor da hotelaria de selva, em:

– Quantas empresas são e suas categorias;

– Qual o volume total de negócios gerados e suas estimativas;

– Quantos empregos diretos e indiretos são gerados pela atividade;

– Seus investimentos por categoria e por meio de hospedagens;

– Desenvolver pesquisas que identifiquem os profissionais do setor;

– Desenvolver estudos que identifiquem os impactos ambientais gerados pela atividade”

 

HN: Existe algum estigma sobre a hotelaria de selva que precise ser quebrado?

Sérgio Carvalho (AHSAB): Este segmento nasceu para atender a pesquisadores e não àqueles que possuem fins de lazer. Trata-se, também, do setor mais delicado da cadeia hoteleira no Brasil, pois ele não segue um padrão comum e requer cuidados totalmente diferenciados, desde produtos consumidos até segurança nos passeios e cuidados com o meio ambiente. Os custos são maiores.

 

Sérgio Carvalho (AHSAB)

 

Augusto Costa (Anavilhanas Lodge): Acho que sim. Hotelaria de selva é geralmente associada a uma hospedagem de baixa qualidade e com pouco conforto. Além do receio com a qualidade muitas pessoas fantasiam a selva como um lugar hostil e perigoso para se visitar.

O que nós oferecemos, no entanto, é uma experiência enriquecedora em todos os aspectos, com qualidade, segurança e conforto. Quem visita a selva amazônica faz muito mais que uma simples viagem: se impressiona com a beleza e riqueza natural da região, passa a entender a complexidade da maior floresta do mundo e leva consigo uma experiência e um conhecimento que não se adquire em qualquer viagem.

 

Peter Tilanus (Tiwa): Em um hotel comum o hóspede é anônimo. Fazemos de tudo para que ele se sinta com privacidade. Nos empreendimentos de selva acontece o contrário, fazemos de tudo para nos aproximarmos dele. Nossos colaboradores recebem treinamentos muito mais específicos. Acham que o setor é maior do que ele realmente é.

 

Sofia Takase (Juma Lodge): As pessoas fazem muitas comparações com hotelaria urbana, acham os preços dos hotéis de selva muito elevados. Sinto que existe um pouco de preconceito.

 

Sofia Takase, do Juma Lodge

 

Paulo Augusto (Rio Negro Lodge): A atividade é muito peculiar. Quando você fala “hotel”, a surpresa do cliente pode ser muito positiva ou muito negativa.

 

Peter Tilanus (Tiwa): Brincamos que os clientes vem procurar uma experiência amazônica e que, “por acaso”, eles estão em um hotel.

 

Paulo Saldanha (Pakaas Palafitas Lodge): Durante o dia o cliente encara calor, frio, chuva e susto. À noite, quer a tranqüilidade de um sono reparador.

 

Peter Tilanus (Tiwa): No conforto de um hotel!

 

Peter Tilanus (Tiwa)

 

HN: A associação pode atrair mais turistas brasileiros e estrangeiros à Amazônia?

Peter Tilanus (Tiwa): Sim, e este é um grande objetivo. Além disso, precisamos criar produtos que estendam a estada dos turistas para que fiquem três dias em um hotel, dois em outro…isto seria algo inédito.

 

Das ações comerciais previstas:

– Promoção comercial e captação de demanda em nível nacional e internacional;

– Presença nos principais Salões e Eventos de Turismo em nível nacional e internacional;

– Publicação de revista eletrônica e escrita para a divulgação de guia de consulta rápida com mapas e informações básicas da cadeia de hotelaria de selva, para os visitantes e passageiros das salas de embarques (nacional e internacional).

 

 

“Nosso discurso é pródigo em destacar a força do turismo regional na Amazônia, em que um empreendimento hoteleiro se complementa com os outros em seus produtos,
sem risco de competição”

 

HN: Quais são as perspectivas do aumento de ocupação para o ano que vem?

Peter Tilanus (Tiwa): Daqui a um ano, desejo que a associação tenha criado uma plataforma de produtos e clientes que dêem retorno já em 2010.


Paulo Saldanha (Pakaas Palafitas Lodge):
Fala-se muito de turismo interno considerando a crise. Agências de turismo de Rondônia estão focadas na venda de passagens aéreas e ainda não perceberam o filão do receptivo.

 

Paulo Saldanha, do Pakaas Palafitas Lodge

 

Sérgio Carvalho (AHSAB): A associação nasceu com a sorte de ter muitos admiradores. Com certeza, daqui a um ano queremos ter o dobro do tamanho que temos hoje.

 

Peter Tilanus (Tiwa): Precisamos atingir aqueles que querem viajar pelo Brasil especificamente para conhecer a Amazônia. Este mercado é super pequeno, quase inexistente. Se alcançarmos este público, a chance de aumentarmos os números é muito grande. No entanto, é bom lembrar que o turismo aqui não pode ser de massa e  deve ser delimitado como parte dos cuidados que devemos ter com a natureza.

 

HN: A Associação precisa de quais tipos de apoio e incentivo para que seja fortalecida?

Peter Tilanus (Tiwa): Reconhecimento, portas abertas e apoio financeiro.

 

Sérgio Carvalho (AHSAB): O diferencial da associação é o próprio setor. O Peter fala da preocupação com o turismo de massa, com ações baseadas na sustentabilidade integral da categoria como um todo. Vamos buscar benefícios fiscais para este tipo de atividade. Não adianta ser taxado por estar em um ambiente de floresta. Não é o chicote que vai resolver alguma coisa, é a parceria.

 

Das parcerias institucionais:

– Criar um ambiente de estabilidade para investimentos em empreendimentos de hotelaria de selva, mediante definição de políticas e normas internas e do apoio no fortalecimento dos órgãos de gestão ambiental e desenvolvimento turístico estadual;
– Auxiliar na viabilização operacional de empreendimentos por meio da realização de estudos de mercado, da identificação, desenvolvimento e adaptação à região de tecnologias para geração de energia, tratamento de efluentes, etc., e da sua disponibilização dos resultados para investidores privados;
– Auxiliar e apoiar na viabilização de financiamento de empreendimentos mediante a identificação de linhas de crédito específicas para o segmento

 

Peter Tilanus (Tiwa): Todos falam que turismo de selva é caro e é mesmo. Isto porque tudo é mais caro neste setor. Se conseguirmos definir muito bem nosso caminho, os turistas vão querer pagar este valor, senão mais. É preciso que haja divulgação, definição de produtos, barreira ao turismo de massa. Este tipo de ação faria as pessoas pagarem mais.

 

Augusto Costa (Anavilhanas Lodge): De entrada de novos membros, organização interna e um plano de ação coerente. Os apoios e incentivos devem decorrer deste trabalho que, ao meu ver, serão naturalmente conquistados com sua consolidação como representante do segmento.

 

HN: Vocês dizem que a Amazônia é uma marca. Por quê?

Augusto Costa (Anavilhanas Lodge): É só olhar para o maior site de vendas da internet e observar seu nome. A Amazônia é um conceito presente no inconsciente coletivo de boa parte dos habitantes da Terra. Por si só é uma marca, cada vez mais ameaçada e muito pouco conhecida.

 

Arquipélago de Anavilhanas, no Amazonas. “Se o Brasil te conhecesse antes do fim que se aproxima,
salvaria tua beleza?” – Milton Hatoum

 

Peter Tilanus (Tiwa): É uma das palavras mais conhecidas do mundo, gera sensação de aventura. A Amazônia é muito bonita.

 

Paulo Saldanha (Pakaas Palafitas Lodge): Por causa de sua beleza, importância, biodiversidade – a maior do mundo -, pelo tamanho de suas árvores, enfim, pelo colosso que representa.

 

HN: A hotelaria de selva deve ser praticada de acordo com os princípios da sustentabilidade. O que fazer para contornar possíveis impactos ambientais?

Augusto Costa (Anavilhanas Lodge): Um bom começo é respeitar a legislação ambiental hoje existente. Os impactos ambientais decorrentes de um empreendimento que seguiu as normas da implantação à operação gera relativamente pouco dano. E este é um dos segredos do sucesso de um hotel de selva. Problemas inesperados podem surgir e o empreendimento é sem dúvida o maior interessado em resolvê-lo. Quem não o fizer estará matando o próprio negócio.

 

Peter Tilanus (Tiwa): Não há outro caminho para a hotelaria de selva que não seja o da sustentabilidade. O código florestal e a legislação ambiental no Brasil estão bem elaborados. É preciso segui-los corretamente. É preciso, também, investir em cuidados com a água e lixo, além do treinamento dos funcionários.

 

Paulo Augusto (Rio Negro Lodge): Estudos de impacto ambiental são fundamentais, assim como a conscientização e o processo educativo do próprio visitante.

 

Paulo Saldanha (Pakaas Palafitas Lodge): A figura do guia também é muito importante. Quando ele é profissional, estimula a proteção ao meio ambiente.

 

Das políticas ambientais e desenvolvimento sustentável:

– Desenvolver estudos que identifiquem os impactos ambientais gerados pela atividade;

– Auxiliar nas necessidades, investimentos e na aplicação das leis exigidas nas atividades do setor;

– Elaboração de manual específico para o desenvolvimento da atividade;

– Desenvolver, em parceria com empresas especializadas, projetos de “Gestão de Resíduos Sólidos e Esgoto” e de “Tratamento e Reaproveitamento de Água”, bem como a identificação de suas linhas de financiamentos;

– Proteger e desenvolver os atrativos turísticos da região amazônica, por meio de medidas como a identificação de parques e reservas com manejo específico para ecoturismo, em parceria com as Secretarias de Meio Ambiente dos Estados

 que formam a Amazônia Legal, IBAMA e outros;

– Desenvolvimento de Ferramentas de Certificação Ambiental em

Empreendimentos de Hotelaria de Selva.

 


Belezas inesperadas…esta foto foi tirada na estrada
de terra do Anavilhanas Lodge
 

HN: Como a hotelaria de selva pode beneficiar a floresta e as comunidades tradicionais, já que turistas são comumente levados a visitá-las?

Peter Tilanus (Tiwa): Se não houver turistas e comunidades tradicionais na floresta, é melhor não ter hotel de selva. Nosso setor pode ser uma ferramenta importante para evitar o desmatamento, o turismo irresponsável e auxiliar comunidades que sofram com a falta de recursos. No entanto, não somos um fundo para dar dinheiro. Somos empresários. Ao invés de dar dinheiro, preferimos investir na construção de escolas, por exemplo.

 

“Seguimos estruturando e desenvolvendo projetos para aplicação nas regiões onde existam atividades hoteleiras, buscando a sustentabilidade das comunidades e do entorno de seus empreendimentos através de ações conjuntas com o poder público de cada localidade”.

 

Augusto Costa (Anavilhanas Lodge): Essa é uma questão delicada. Tratar isso de forma irresponsável pode gerar dois efeitos muito negativos, como dividir a comunidade em função do dinheiro, deteriorando as relações sociais internas e perpetuar uma política assistencialista cuja solução é dar o peixe em vez de ensinar a pescar.

Nosso hotel recebeu a permissão dos comunitários antes de os visitar e os incentivou a usufruir de um fluxo até então inexistente de turistas, com a venda de artesanato e bebidas. No entanto, nem todos se envolveram em tais atividades, gerando desconforto entre alguns. Depois de algumas conversas, passamos a também apoiar a escola rural da comunidade, criando uma biblioteca antes inexistente e doando livros para uso dos alunos.

 

Paulo Augusto (Rio Negro Lodge): A hotelaria de selva promove a geração de emprego e comunidades podem se beneficiar da visita dos turistas com a venda de artesanato.

 

Paulo Saldanha (Pakaas Palafitas Lodge): Levar turistas às comunidades é uma forma de valorizar a cultura, uma vez que os visitantes compram artesanatos. Desta forma, proporcionamos uma maior qualidade de vida à estas pessoas.

 


Chinelos de criança em uma comunidade tradicional próxima ao município de Novo Airão, no Amazonas


Peter Tilanus (Tiwa):
O turismo apoia o desenvolvimento da sociedade.

 

“Da sustentabilidade do entorno e de suas comunidades:

– Engajamento nas campanhas institucionais desenvolvidas nas esferas do Governo Federal, Governos Estaduais e Municipais que tenham as comunidades como público alvo – ex.: Turismo Sustentável e Infância – Prevenção da Exploração Sexual de Crianças e Adolescência;

– Incentivar o turismo e a hotelaria de selva para o desenvolvimento da Amazônia, contribuindo para melhoria na qualidade de vida, liberdades individuais e coletivas, exercício da cidadania plena e democratização de oportunidades”

 

Serviço

www.hotelariadeselvabrasil.com