Cristiano Vasques
(fotos: Aline Costa)
 
“Em 2011 vai ser possível selecionar melhor os clientes e ter mais capacidade de investimento e renovação, sem medo nenhum de ser feliz”, declara Cristiano Vasques, sócio consultor da HVS Global Hospitality Service. “Salvo uma complicação na economia do exterior que traga impacto para cá. Esse risco continua tão sério quanto no ano passado”, pondera.
 
A empresa, que nasceu nos Estados Unidos 30 anos atrás, está no Brasil há 11 e, por meio de seu escritório em São Paulo, realizou mais de 200 projetos, estudos e avaliações feitos de Norte a Sul do País – inclusive, em alguns países da América do Sul, da África e em Portugal. Para tanto, teve que adaptar seus serviços à realidade brasileira.

“Aqui não há a diversificação e sofisticação que temos nos Estados Unidos, por exemplo. Não existe indústria de financiamento para compra, desenvolvimento e refinanciamento de hotéis. E lá grande parte do faturamento dos escritórios da HVS tem a ver com isso, o que se constitui em uma razão para aqui ser diferente, nos fazendo trabalhar mais com informação e inteligência de mercado. No Brasil assessoramos investimentos em hotelaria de forma mais ampla”, explica Vasques.

 
A empresa tem alguns trabalhos em parceria com Fohb e ABIH, e já fez estudos para o Ministério do Turismo. Além disso, participa do núcleo imobiliário turístico hoteleiro do Secovi, “a fim de deixar o mercado mais forte e saudável”, levando-se em conta a importância da boa convivência entre mercado imobiliário e hoteleiro.
 
Formado em Engenharia, o interesse de Cristiano pela Hotelaria surgiu durante o período em que morou na Inglaterra e teve a oportunidade de viajar pela Europa. “Notei que lá o setor era levado mais a sério, era um negócio bem vantajoso”, comenta. “Então, quando voltei, fiz especialização em Turismo e Hotelaria pela Fundação Getúlio Vargas. Foi aí que eu conheci a HVS, fiquei na hotelaria e adorei”.
 
Na primeira entrevista especial do ano, o Hôtelier News conversou com o profissional sobre como a Hotelaria poderá ser em 2011.
 
Por Aline Costa

Hôtelier News: Você acha que o resultado das eleições deve influenciar o setor?
Cristiano Vasques: Em partes, sim. Eu acho que os rumos da economia e a situação do câmbio tendem a ter impacto mais forte no mercado do que necessariamente um trabalho específico do Ministério do Turismo (MTur), por exemplo. Eu acho que a linha do MTur tende a ser a mesma, mas com melhorias e aperfeiçoamento.

Claro que o Mtur é muito importante, não há dúvidas. A Copa do Mundo e as Olímpiadas, eventos que também devem trazer mais turistas, por exemplo, foram captados parcialmente com base no apoio deles. 

Quando a HVS chegou no Brasil ainda não tinha o Ministério do Turismo e depois disso algumas coisas melhoraram. Acho importante o que eles fizeram no ano passado, até como resposta à crise, com o trabalho junto ao BNDES para criar o Pró-Copa, linha de financiamento que faz muito sentido para renovar e implantar novos hotéis. Esse trabalho de articulação está fazendo o mercado hoteleiro ser mais estruturado e profissional, ajudando a criar microambientes mais favoráveis.

HN: A Copa 2014 e Olímpiada 2016 devem trazer transformações para o setor?
Vasques: Todo mundo está bastante ciente que hotel é para cidade e para o país, não para a Copa. O setor está muito ciente. Mas nem todo mundo que resolve fazer hotel é do setor e esses eventos despertam o interesse de investidor que não é profissional, que especula muito sobre eles como uma excelente oportunidade de se fazer empreendimentos hoteleiros. De qualquer forma, em algum momento, ele vai encontrar um profissional que é do mercado e vai abandonar essa visão.

Mesmo o hotel que não é o principal negócio – e isso é muito comum, também pode ser um problema. A pessoa trabalha com construção ou comércio, por exemplo e o hotel acaba sendo planejado, implantado e operado de forma não profissional, deteriorando e enfraquecendo o mercado.
 
Eu acho que o Placar 2015 é muito importante nessa história de conscientizar o pessoal de que hotel é pra cidade e não para Copa. E os atuais hoteleiros são os maiores interessados. Eles estão aí hoje e estarão depois. Eles são importantes para preservar a saúde do mercado hoteleiro, estão conscientes disso e ajudando. Muitos nos procuram para passar informações.

   
   
   
   
HN: Este ano deve ser um bom período para a hotelaria?
Vasques: Sim. Vai ser um ano de de crescimento da economia, de aumento da demanda de negócios, aumento da demanda de eventos e até de lazer – se pensarmos no turismo interno. E o 
aumento será em cima de uma base que já é grande.

Para quem tem hotel, neste ano será possível aumentar tarifa e ter ganhos reais de diária média. Dificilmente vai ter mais oferta, o que significa mais ocupação, mais diária e melhor receita.

  
HN: Podemos dizer que o mercado tem se profissionalizado mais?
Vasques: Está acontecendo uma coisa muito curiosa no segmento hoteleiro, que a gente não se dá conta, e se parece com o que aconteceu com o segmento de construção civil.

Até pouco tempo atrás, coisa de quatro, cinco anos, muitas das empresas de incorporação e contrução civil eram familiares. Foi de muito pouco tempo para cá que começou o processo dessas empresas se organizarem melhor, irem à Bolsa de Valores e começaram a se consolidar. Ou seja, essas empresas pequenas e médias começaram a se consolidar, se unir e hoje em dia o mercado de incorporação e construção civil no brasil é muito diferente do que era há pouco tempo. Havia empresas não muito transparentes e não tão profissionalizadas, além de pulverizadas. Agora, elas estão mais concentradas, são algumas poucas grandes empresas que se associaram com outras regionais que atuavam só uma praça, apenas em São Paulo, só no Rio de Janeiro, somente no Rio Grande do Sul; ou ainda só no interior de São Paulo, etc. Hoje em dia você tem grandes empresas que atuam em nível nacional se associando com as menores empresas de capital aberto com ações negociadas na Bolsa.

 
Provavelmente o mercado hoteleiro brasileiro deve seguir pelo mesmo caminho. A BHG, por exemplo, está trazendo uma lógica empresarial diferente para o setor. Assim como a Allia, que mostra uma iniciativa nova de junção de redes.
 
Isso é bom porque significa um mercado mais profissional, com oportunidades para todo mundo, empreendimentos mais lucrativos, essa é que é a ideia. E o desafio vai ser fazer isso mantendo o charme do hoteleiro, que é uma coisa que sempre existiu. 
HN: Temos acompanhado um grande número de inaugurações de hotéis econômicos. Como você analisa essa questão? O País tem realmente mais espaço para essa categoria?
Vasques: O momento do mercado é de crescimento forte na demanda de hospedagem, com recuperação do desempenho dos hotéis que já existem porque tem mais gente ficando em hotéis e aumentando a ocupação em todo País.

Tipicamente o mercado recupera primeiro a ocupação e depois a diária média sobe, pois é quando os hotéis estão cheios que os gerentes conseguem negociar melhores tarifas. Desde 2007, pelo Brasil afora, os hotéis têm tido aumentos sucessivos de diárias. Como consequência, os que estão em operação têm resultados mais satisfatórios, mas isso ainda não significa viabilização de novos meios de hospedagem porque os níveis de diária que a gente tem hoje, por enquanto, não são suficientes para rentabilizar o investimento. Isso porque empreendimentos novos são muito caros para se implantar. Hoje em dia, o investimento inicial é muito alto, e apesar do aumento da demanda e desempenho melhor, ainda não é suficiente para remunerar o capital investido.

Atualmente não há razões muito claras para abrir um hotel novo. Fazendo todos os estudos, o investidor vai ficar decepcionado com a rentabilidade e vai desistir do projeto. Enquanto esse for o clima, a demanda vai continuar aumentando, até chegar o ponto em que se tornará sim viável a construção de novos empreendimentos. E isso deve acontecer com os hotéis que começarem a ser estruturados em 2011, 2012 e, principalmente, em 2013. Ou seja, empreendimentos que serão inaugurados em 2014 e 2015 provavelmente serão viáveis.
Até lá, teremos um ou outro empreendimento novo. O grosso do crescimento da oferta será em 2014 e 2015, com os hotéis que começaram a ser feitos em 2012, 2013. Aí sim vai ter retorno interessante da oferta, e algo em torno entre sessenta e cem hotéis serão construídos por ano no Brasil para acompanhar crescimento da demanda. Se surgirem setenta, cem hotéis por ano será um crescimento saudável.

 
HN: Isso vale para o mercado de Luxo? Por que temos tão poucos empreendimentos do tipo no Brasil?
Vasques: O pessoal quer entrar no Brasil, mas o custo inviabiliza qualquer operação. O problema no País hoje é o preço do terreno, que para esse tipo de empreendimento precisa ser na área mais nobre da cidade e aqui eles são mais caros e mais caros. Ou seja, os terrenos são mais que proporcionalmente mais caros que em outros países.
 
Achar um bom terreno em um lugar nobre é muito difícil. Quando você acha, o preço é pouco razoável, ele não torna viável a operação, os custos de construção no Brasil estão muito altos.
 
Eu estava conversando com um executivo que me disse que o hotel que ele está construindo no Panamá vai custar US$ 900 o metro quadrado. Já no Brasil o custo seria de US$ 2 mil!. Esse valor é alto, mesmo levando em conta o câmbio. Além disso, tem muito imposto em todo o processo – construção, mão de obra, insumos – e o mercado de construção e imobiliário está extremamente aquecido. Tudo isso complica a implantação. Demanda até existiria, seria possível até conseguir boas diárias e lucro, mas o grande problema é o investimento.
E existe um segundo ponto: a maioria das redes de alto padrão não está disposta a fazer esse investimento. Elas querem que alguém invista e as chamem para administrar. Isso por enquanto não deve acontecer porque esses projetos não são muito rentáveis. A rentabilidade baixa, os altos custos e toda a burocracia do processo não valem a pena mesmo para o investidor local, que já está acostumado com o funcionamento do mercado brasileiro.
 
HN: Existe alguma alternativa para driblar essas questões?
Vasques: Uma forma de fugir desses problemas é fazer projeto de uso misto, no qual você tem imóveis residenciais com assinatura de uma marca, mais torre corporativa, mais hotel. Talvez isso faça sentido para elevar a rentabilidade e variação de risco. Lá fora esse tipo de projeto é muito comum.
 
Já tem incorpoaradora procurando a HVS para fazer hotel não no lugar de torre corporativa, mas como parte de um projeto de uso misto, porque eles estão começando a perceber que mesmo o mercado corporativo será super ofertado daqui dois, três anos
talvez.

Vai ter espaço para o Luxo, é só entender o timing. Ainda não é o ano que vem, mas vai ser de Norte a Sul do Brasil. Terá demanda para todos os produtos, mas o caminho ainda é melhor para produto econômico. Há uma vocação natural na economia das cidades brasileiras para produtos assim. Tanto que as principais redes internacionais que já estão aqui querem desenvolver novos produtos econômicos e as que não têm estão tentando ter como carro chefe de entrada no Brasil esse tipo de hotel.
Com o aumento da renda a tendência é que as pessoas, que normalmente ficavam em pensões ou casa de parentes, passem a usar mais hotéis. Isso vai acontecer não só nos mercados urbanos, mas também no mercado de lazer. Podemos ter produtos hoteleiros de lazer econômico mais voltado para operadoras, resorts de lazer mais simples.
Esse cenário existe por conta do crescimento econômico do País e aumento da renda, que tende a trazer gente nova para o mercado. Gente que vai consumir pacotes e hospedagem. Ressalto que estamos falando basicamente do mercado doméstico, pois por conta do câmbio e pelo fato dos maiores emissores mundiais de turistas estarem com a economia abalada, não devemos receber muitas visitas de estrangeiros por um longo período.
O dinheiro deles vai vir para cá sim, mas buscando rentabilidade. O pré-sal também deve gerar novas divisas. O cenário que a gente deve trabalhar é o de Real valorizado, moeda fortalecida, não deve contar com demanda externa. No máximo, uma demanda externa 
sul-americana, mas ainda é pouco.

 

HN: Vale a pena abrir hotéis de lazer no Brasil?
Vasques: A percepção que a gente tem aqui é que o mercado de lazer, de resorts, é muito sazonal e acaba fazendo com que o investimento seja de um nível de risco muito alto. Só valeria a pena abrir um hotel de lazer se a rentabilidade dele fosse muito maior que a de um hotel urbano, mas o que a gente vê é justamente o contrário.

Os produtos de lazer do mercado brasileiro estão passando por um período bastante complicado mesmo, e do jeito que a gente vê a economia, não teremos mudanças em curto prazo. Enquanto o câmbio tiver assim, enquanto os custos forem tão altos e a sazonalidade tão grande, é preciso ter muita certeza de que o produto é excepcional e bem localizado, ter os custos muito ajustados e tentar criar e atrair outros segmentos que não o de lazer. Só que mesmo eventos têm sazonalidade, e as duas juntas tendem a não ser suficientes. Precisa ter muito cuidado, hoje em dia é muito difícil justificar um investimento desses.
HN: Diante de tudo o que conversamos até então, quais as peculiariedades do mercado paulistano?
Vasques: O problema de São Paulo hoje é encontrar bons terrenos com preços razoáveis. Não há terrenos bem localizados com preço que justifique a implantação. É só esse o problema de São Paulo. E isso acontece porque o mercado imobiliário, comercial e residencial está muito aquecido. No momento, essas modalidades vendem rápido, com alto valor e baixo risco.
Outro problema que é geral, não só de São Paulo: no exterior, e especialmente na hotelaria, um meio de hospedagem é investimento com financiamento de base imobiliária com lógica de entrada e saída. Você faz um hotel e viabiliza esse empreendimento, e depois que ele está funcionando existe uma maneira do empresário ou investidor sair do investimento e realizar o lucro da operação. E aqui no Brasil não existem mecanismos muito claros que facilitem a saída do investidor do meio de hospedagem.

Lá fora existem diversas formas, existem seguradoras que restituem fundos de pensão e bancos que refinanciam o hotel. Depois de três ou quatro anos o empresário vê que o hotel é um sucesso e decide refinanciar a aplicação para realizar o lucro.

No Brasil não tem muitas opções e o investidor ainda tem receio de não conseguir sair, e ele não vai querer ficar pelo resto da vida. No exterior o hotel é um ativo financeiro de base imobiliária, mas é prioritariamente um ativo financeiro que pode ser realizado e depois você sai da ação se quiser. No Brasil isso não existe com custos razoáveis e garantias.
 
HN: E se você fosse abrir um hotel, como ele seria?
Vasques: Se eu fosse ter um hotel, eu compraria e reformaria um meio de hospedagem em uma cidade com base econômica diversificada. Hoje é a melhor opção de investimento: faça reforma, reposicione se for o caso e você já começa ter fluxo de caixa imediato. Se possível, eu compraria ou no Rio ou em São Paulo, que são cidades com diferentes setores econômicos e diferentes segmentos de demanda. Têm alguma coisa de lazer, de eventos, de grupos e de negócios.

E também procuraria uma empresa especializada para me dar consultoria (risos).

 
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