Eliane Tanno e Leonardo Melro, da Yield Hospitality
Marketing, falam sobre o famigerado RM
(fotos: Peter Kutuchian)
 
Revenue Management, ou gestão de receitas, é um dos assuntos mais debatidos em seminários, palestras e encontros de hotelaria, além de ser tema de cursos em diferentes instituições e pauta para matérias em veículos especializados. Aqui no Hôtelier News, já foram publicadas matérias especiais dando um panorama geral sobre o tema e mostrando como o assunto é tratado nas universidades. O que se vê na prática, no entanto, é uma aplicação ainda muito precária do revenue management. Mas, se os hoteleiros compreendem a importância e os resultados trazidos pela prática do RM, o que falta?
 
Em entrevista exclusiva para o Hôtelier News, Eliane Tanno e Leonardo Melro, respectivamente diretora estratégica de receitas e diretor executivo da Yield Hospitality Marketing, explicam um pouco sobre o cenário da gestão de receitas e as opções oferecidas por sua empresa, que trabalha com consultoria de forma estratégica para a implantação e manutenção do revenue management.
 
Por Juliana Bellegard, com colaboração de Peter Kutuchian
 
A prática de revenue management na hotelaria começou com as grandes redes norte-americanas, e como bons brasileiros, temos a impressão de que estamos para trás nessa nova tendência mundial
de gerenciamento estratégico de receitas. Eliane explica que não é bem assim. A executiva teve seu primeiro contato com RM na Marriott e trabalhou em implantações no Mantra Punta del Este e no corporativo da rede Blue Tree. Ao longo dos anos, ela pode ter contato com outros revenue managers do mundo todo e afirma: “Acho que o Brasil está começando a despertar para esta filosofia. Entrando em contato com colegas de área no exterior, percebi que isso não está acontecendo só aqui. Os hotéis independentes em todo o mundo estão começando entender essa cultura. Mesmo na Europa, muitos ainda trabalham RM só como inventário”.
 
 
“O pessoal tem que tirar da cabeça que o revenue é só isso, trabalhar inventário para maximizar a receita quando há demanda. RM também funciona para você criar demanda”, diz Melro, que já havia trabalhando com Eliane tanto na Marriott quanto no Mantra. Após a temporada no Uruguai, ele estava convencido de que este era o momento próprio para apostar neste mercado de implantação não só de softwares de RM, mas de toda sua cultura. “Acredito que o mercado está quente em relação a esse assunto, há interesse dos hoteleiros em entender como incorporar a ferramenta no dia-a-dia. Por outro lado, a gente vê a carência justamente de empresas especializadas em consultoria estratégica. O que estamos vendo agora é todo mundo querendo chegar com as ferramentas, software”, conta. Assim, nasceu a Yield Hospitality Marketing.
 
“Não adianta você ter o software e não ter a expertise de como extrair as informações a seu favor, saber analisá-las e usá-las da forma correta”, continua Melro. A oportunidade de oferecer algo inédito no mercado, que fosse de encontro com as tendências da hotelaria e também com os desejos dos hoteleiros, veio a partir desta percepção do mercado. “O que vimos foi uma oportunidade de, em vez de um on propriety revenue manager, poderíamos fazer um trabalho de RM sem estar constantemente dentro do hotel. Implantar a filosofia, implantar o conceito, treinar a equipe, fazer o setting do negócio, adaptar o sistema, enfim, fazer a implantação. Depois disso, daríamos continuidade ao trabalho com a parte de consultoria estratégica. Essa é a nossa proposta na YHM”, explica.
 
Eliane conta que sua expectativa é exatamente auxiliar e ver crescer no mercado brasileiro essa cultura de gerenciamento de receitas como algo estratégico. Por isso, o serviço oferecido pela empresa vem como em um crescendo, adaptando-se ao interesse de cada um dos clientes. “Dividimos o trabalho com RM em vários módulos. Assim, o hotel adquire o serviço que quer naquele momento, de acordo com a fase em que a empresa está”, afirma a diretora. “Cada uma das etapas envolve uma equipe: reservas, comercial, diretoria. Às vezes, no momento, a empresa só quer a parte de inventáiro, por exemplo. Outras já querem trabalhar o business plan para o ano seguinte, fazer uma mudança no comercial e quer os recuros de RM para isso”, conta.
 
 
O início do trabalho
Como, então, começar a implantar o revenue management? Qual a recomendação para um hotel que ainda não tem nada? “Temos alguns exemplos práticos disso. Fomos procurados por um empreendimento que tem representatividade dentro do set competitivo, uma boa ocupação, mas quer crescer, aumentar o RevPar [Receita por Apartamento]. Para isso, é preciso aumentar a diária média, algo que não pode ser feito de uma hora para outra”, elucida Melro. A proposta dos consultores foi de implantar uma cultura de RM primeiro, informando toda a equipe do hotel sobre o conceito e suas práticas. “Este primeiro módulo é uma coisa mais básica, são palestras e seminários nos quais desenvolvemos essa interação dos departamentos, até a nível gerencial, para falar sobre RM, qual impacto da ferramenta no negócio etc”, conta.
 
“Para um hotel que nunca trabalhou com RM, não consegue ler os números, interpretar as informações, o mais improante é a parametrização do sistema, a parte de inventário”, diz Eliane. Os primeiros passos, de acordo com ela, são uma avaliação dos dados do hotel, como a empresa está lidando com esses números, ver o nível de compreensão da equipe. “Converso com a direção para saber como é o sistema deles, o que tem lá, quais os relatórios que eles utilizam, que ferramentas, como avaliam o desempenho disso. É lá que está o banco de dados”, aponta. É preciso estar atento ao que o cliente quer. “E, na verdade, quando você apresenta o serviço, explicar o que é o RM, os hoteleiros querem tudo, desde a cultura até o business plan. Eles veem a necessidade disso”, relata ela.
 
Mas é claro que uma mudança drástica no modo como um hotel funciona não acontece da noite para o dia. Melro menciona que a consultoria de RM é um processo que pode durar, em sua fase inicial, até um ano. A partir disso, dessa construção da base da cultura, inicia-se a segunda parte do trabalho da YHM: a consultoria estratégica. Para isso, é preciso que a equipe envolvida já tenha se conscientizado dos processos, conceitos e práticas do que está sendo implantado dentro do empreendimento. “O que estamos oferecendo é um trabalho muito customizado, falando pessoalmente com os decisores do hotel. Fazer análise de relatórios, recomendações, números, tudo isso requer tempo, dedicação e talento para o negócio”, diz.
 
Outro detalhe importante dentro do trabalho da consultoria, reforçado pelo diretor, é a confidencialidade das informações. “Zelamos por isso sempre. Se temos um cliente de um determinado mercado, não é possível trabalhar com seu set competitivo. Potencialmente, se eu faço uma consultoria para um hotel no Rio de Janeiro, fatalmente eu só vou ter esse hotel como cliente naquela região”, coloca.
 
 
Como funciona na prática?
Um exemplo interessante de ser relatado como um case de sucesso de implantação de revenue management é o trabalho feito por Eliane no Mantra Resort Spa Cassino, em Punta del Este, no Uruguai. A diretora conta um pouco sobre o processo: “Foi minha primeira implantação, o primeiro contato que tive com este tipo de trabalho, em 2008. Mas foi muito interessante porque a implantação da ferramenta e do conceito aconteceu em apenas três meses, muito rápido. Em um ano, com uma equipe que tem outra língua, outra cultura e tudo mais, conseguimos um ótimo resultado: vender US$ 1 milhão a mais do que no ano anterior. Isso falando de um hotel pequeno, com cem apartamentos”.
 
Embora a equipe do empreendimento nunca tivesse trabalhado com RM antes, foram bastante abertos quanto às sugestões de Eliane. Com informações, implantação das ferramentas corretas, criação da cultura e muita disciplina foram os elementos-chave para o sucesso. “Depende muito da equipe e, neste caso, eles foram muito abertos. Confiavam no que propúnhamos, não havia resistência alguma. Trabalhamos com públicos e áreas que não existiam dentre os clientes do resort, além de implementar nossa opções. Por exemplo, eles só tinham café da manhã, e minha sugestão foi oferecer meia-pensão também, para alavancar a receita de A&B”, diz.
 
Resta, portanto, uma dúvida: o que impede a hotelaria brasileira de, finalmente, implantar essa cultura de RM em seus negócios? Para Melro, existe uma resistência em se modificar o modo de trabalho dentro dos empreendimentos. “É aquela história de quem mexeu no meu queijo, sabe? A primeira reação das equipes é pensar que tinham seus processos de determinada maneira e daí vem o RM e pede para fazer de um jeito diferente”, conta, afirmando que é necessário que os colaboradores comprem a ideia da implantação da gestão de receitas. Eliane complementa dizendo que é um processo que exige muita disciplina e colaboração de todos. “Para funcionar, é preciso informações, dados. E, para isso, é necessário que a pessoa preencha os relatórios, formulários. Não é uma coisa muito gostosa de se fazer, é uma desconstrução de paradigmas. Mas conforme você vai vendo resultado, isso vai sendo uma coisa positiva”, garante a diretora.
 
 
Aos hoteleiros, diz ela, falta essa cultura de interpretação de informações. E é esse o papel do revenue manager: ensinar os gerentes e diretores a lerem os números e trabalharem com isso pensando em um resultado objetivo. “Já dissemos que o RM não é só inventário. Ele é uma alavanca para vendas e marketing, esse é o papel principal dele: fornecer informações para a tomada de decisões. Para isso, a equipe inteira tem que estar envolvida”, diz. Por isso, a próxima vez que você reclamar com seu recepcionista sobre a falta desta ou daquela informação, pense que ele pode nem saber para que existem aqueles campos nas fichas e cabe a você, gestor, informá-lo. “É uma questão de educar. É uma cultura”, reflete Eliane.
 
“Nada está escrito em pedra”
Para ambos, a versatilidade na hora de se tomar uma decisão é a grande vantagem da gestão de receitas. Os hoteleiros perdem essa visão estratégica dos dados quando optam por ignorar as práticas de RM. “Se você não tem informações, dados para tomar uma decisão, é muito complicado. O RM oferece essa interpretação, recomendações, vai buscar informações e te dá uma racionalidade para tomar decisão”, esclarece ela. “Nada, no RM, está escrito em pedra. Você implanta e é importante que a equipe tenha essa evolução. Novas ideias tem que surgir, o tarifário não precisa ser o mesmo no próximo ano. Acho que é esse o papel do revenue, dar liberdade para a equipe pensar”, explica a diretora, e Melro faz coro. “RM prega que a decisão seja feita em conjunto. Se acertou, acertamos, se errou, erramos. Não é só um cargo, uma pessoa, mas também é uma prática feita por todas as peças que formam a área comercial do hotel”, afirma ele.
 
Por isso, de acordo com o diretor, a proposta da YHM é o velho clichê “ensinar a pescar”. “Esse processo de tercerização de RM não é para que o hotel receba tudo mastigado da consultoria. No fim do processo de implantação, sua equipe vai voltar para a estaca zero porque não absorveu a cultura”, alerta ele. A integração de toda a equipe com o trabalho é essencial para o sucesso das práticas de RM. “É importante ter um PIP – person in the pocket. Preparar uma pessoa lá dentro do hotel para dar continuidade a esse trabalho. Acreditamos muito nisso: a informação tem que ser gerada pelo hotel”, explica.
 
 
“Conhecimento é poder. Com esse movimento levantado pelas redes, revenue management não é mais algo que está na mão de alguns poucos executivos. Este conceito está começando a ser democratizado. Já é possível falar-se não só em fazer uma venda, mas se essa venda interessa ou não para o hotel. Fazer uma venda estratégica”, finzaliza Melro.