Representantes da hotelaria nacional reunidos
com o ministro Pedro Novais, no início deste mês

(foto: divulgação)

 
Talvez uma das máximas de maior dimensão escrita por Karl Marx – “Trabalhadores do mundo, uni-vos” – tenha atingido o mercado hoteleiro. Notadamente não são operários que, quase dois séculos após o filósofo alemão ter traçado tal bravata, se unem para pleitear redução das jornadas de trabalho ou o fim da mais-valia; e sim entidades e grandes corporações da indústria em questão que seguem de mãos dadas para articular interesses afins.
 
Por esses dias, hoteleiros estadunidenses pressionavam o governo para facilitar a emissão de visto a turistas. Na lista, apresentada por representantes da Marriott International e Starwood Hotels and Resorts, o olhar primeiro era facilitar a entrada de brasileiros, chineses e indianos na terra do tio Sam. O CEO da Starwood, Frits D. van Paasschen, até externou que tais mudanças ocorreriam “em um ritmo típico do governo” – leia-se morosamente.
 
Mas as intrincadas peripécias a favor do empresariado funcionaram em tempo recorde, e, de forma vicariante, o consulado norte-americano em São Paulo pretende agilizar atendimento a estrangeiros com a abertura, a partir de novembro, de três a cinco postos de atendimento na capital paulista – para recolhimento de impressões digitais, entrega de formulários e outros pontos que tornem mais amistosa e rápida a emissão do visto.
 
A reavivada da articulação com o governo e os frutos já provenientes desta ação deixam claro o poderio que a iniciativa privada tem frente à tomada de decisões em prol de interesses corporativos. É dela que emana uma série de manifestos que funcionam numa outra gramática. A diferença de movimentos tocados pelo privado e pelo público é como a diferença entre ciência e arte: na esfera particular tudo pode ser imaginação, exploração e choque de novidade, com medidas sem regra para criar novas formas que melhor tirem um setor da beira do abismo; já a voz pública aperta o botão, pode fazer as coisas acontecerem pela influência de articulação, mas é quadrada e burocrática neste processo, mesmo figurando numa posição sine qua non.
 
Ainda que incipiente, o modelo tem ganhado mentalidade no Brasil. Numa entrevista recente, Ana Maria Biselli, diretora Executiva do Fohb (Fórum dos Operadores Hoteleiros do Brasil), teorizava que o mercado só se desenvolverá se planejado neste sentido. Ela esclareceu inclusive ser um dos eixos estratégicos, da atual gestão da entidade, fortalecer esta integração no setor, sentando à mesa com o Ministério do Turismo para angariar interesses comuns.
 
Este engajamento tem ganhado fôlego. Conforme apurou o Hôtelier News, entidades da hotelaria e parlamentares debateram, na última semana, pleitos comuns ao setor na Bahia. No 2º Encontro Estratégico entre a Hotelaria Nacional e Parlamentares, abertura de linhas de crédito, incentivos fiscais, desoneração, mão de obra temporária e qualificação, palavras corriqueiras entre as reivindicações históricas do trade brasileiro, estiveram no centro dos debates. Presumivelmente, é sinônimo de que a magnanimidade do pensar coletivo e de forma sistêmica começa a dar sinais de que reverbera no mercado nacional, iniciando processos de formalização de dados e estatísticas para comprovar a importância da atividade no cenário econômico do País.
 
“Estamos falando de um setor que emprega quase um milhão de pessoas, entre empregos diretos e indiretos. Mesmo assim, o turismo ainda não é enxergado como uma indústria de relevante importância para o País”, defendeu Roberto Rotter, presidente do Fohb, durante o encontro na capital baiana.
 
Além de comprovar os erros e a visão cega do governo, essas palavras ajudam a entender por que o Brasil continua perdendo a corrida do turismo, por conta da deficiência de um cenário mais brando à atividade. Conscientizado disso, o mercado hoteleiro pode ver a chance de eliminar o demônio filisteu que sucumbem com o mar a hotelaria nacional. É do corporativismo demonstrado no encontro que surgirão ferramentas que exorcizem os fantasmas tributários e tragam poder de barganha à atividade. Mecanismos inéditos podem nascer daí, na tragédia como criadora da forma. Em meio à lama de acusações, é isso que Pedro Novais ainda não percebeu.