Terreiro de Jesus e Igreja de São Francisco,
pontos turísticos do Pelourinho
(foto: pt.wikipedia.org)
 
É sabido que a indústria do turismo recorre a inúmeros instrumentos da infraestrutura de um espaço para que se torne realizável. Hotéis, aeroportos, estradas, mobilidade urbana, restaurantes e afins seguem no âmago da questão quando se pensa no desenrolar da atividade. Todavia, apontamentos como receptividade da população, informações turísticas e controle da violência, de tal forma que evite a vulnerabilidade do entorno quando se cita a segurança, estão nos interstícios do tema.
 
Símbolo primeiro do estado baiano, o Pelourinho tem sido capítulo à parte quando se pensa na quietude dos locais – ou na falta dela – para se consolidar o fazer turístico. Há muito são os sinônimos da prostituição, da venda de drogas e da violência que se transfiguram nas ruas da maior riqueza do Centro Histórico de Salvador, tombada pelo patrimônio da humanidade da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura).
  
O cáustico depoimento segue de mãos dadas aos chamados da imprensa também, não só local como grandes corporações midiáticas, que tem noticiado a violência que contrasta com as atrações artísticas, musicais e opções de bares, restaurantes, lojas de roupas, artesanatos e joias, museus, hotéis, teatros e igrejas que um dia figuraram no Pelourinho chamando a atenção.
 
Quem ali circula é tomado por outro tipo de imagem. Os casarões históricos abrigam mendigos e usuários de psicotrópicos, numa transparência da degradação social ali desenhada, afastando baianos e turistas. Barracas de praia foram suprimidas, sem nenhuma reengenharia de processos estruturais – fórmula da predileção dos manuais de Administração -, e o resultado foi o esperado: desemprego que aumenta na mesma sinergia do número de ambulantes, criando ojeriza por parte dos turistas que são interpelados de minuto a minuto – seja para comprar algo ou até mesmo ser vitimado por algum garoto de pouco mais de dez anos que leva à mão um canivete e um litro de cola.
 
Na década de 1990, eram quase 400 estabelecimentos comerciais na região. Hoje o número não atinge os 200. O empresário, que em seu cerne leva o lucro, não quer investir sem que haja probabilidade de retorno tangível. O processo de degradação e abandono assola o fazer turismo no Pelourinho. E à mercê disto fica todo o sistema social ali existente, com uma população que depende da atividade econômica e da possibilidade de se viver num espaço humanamente possível de estar vivo e não ser rechaçado.
 
Para fortalecer o alarde, o portal IG noticiou, semanas atrás, que o poder público desconhece e não mensura os crimes que ocorrem no Pelourinho, defendendo que o problema primeiro é a “sensação de insegurança”, e não a violência em si. A falta de números, essenciais ao planejamento da segurança pública, tem como justificativa o fato de a Deltur (Delegacia de Proteção do Turista) e de a 1ª Delegacia de Salvador, que recebem as ocorrências do Pelourinho, abrangerem áreas maiores do que a do Centro Histórico, resultando num descompasso dos fatos.
 
Os advogados da causa defendem que é a própria mídia que desenha esta “inverossímil” situação do Pelô, como é conhecido pelos baianos, argumentando que a enxurrada de drama não existe.
À revelia disso, vale o exemplo do Rio de Janeiro, que não faz muito tempo era alegoria da violência carioca, porém recentemente, com um trabalho incisivo das UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) junto à Secretaria de Segurança Pública, tem feito revés da violência para retomar a áurea do turismo que tanto carrega. Longe da perfeição, a melhora no Rio serve ao menos como norte e, sim, em parte, foi também desenhada pela mídia – para o bem ou para o mal.
 
Necessário rememorar que a situação turística de uma cidade nada mais é do que a situação social à qual sua população está exposta. Postergar o debate é postergar a ferida, o que pode trazer uma gangrena nefasta para o Pelourinho e para o cidadão local, com o turismo pegando carona neste fado.