Otavio Novo é especialista em Gestão de Crises
(foto: arquivo pessoal)

No nosso dia-a-dia, e especialmente no atual momento que vivemos, é comum ouvirmos que o setor de hospitalidade é muito sensível às crises. A ideia predominante é a de que, as viagens, e consequentemente, hotéis, restaurantes, receptivos, agências e toda a estrutura que participa das atividades do setor, são os primeiros serviços e investimentos cortados num momento de contenção e escassez de recursos. Sem dúvidas os riscos e as crises costumam ser muito impactantes para as atividades da cadeia de hospitalidade, contudo, será sempre assim? Não há nada a ser feito para mudar essa característica? Certamente há, e as práticas de Gestão de Riscos e de Crises tem papel fundamental no fortalecimento do setor de turismo e de toda cadeia de hospitalidade.

E para entendermos melhor essas possibilidades, cenários e desafios, o primeiro passo é definirmos os conceitos de risco e crise. Na literatura e em estudos realizados sobre o tema, existem diversas definições para riscos e crises no ambiente dos negócios e das relações sociais, entretanto, nesse momento, podemos resumir a ideia da seguinte forma: Crise é todo evento onde há a transformação de um risco potencial em perda real, causando impactos negativos importantes para pessoas, negócios e/ou reputação de uma organização ou localidade.  Portanto, é dado destaque aos valores humano e econômico, incluindo a imagem da empresa no mercado. Normalmente, os eventos são mudanças abruptas e repentinas de uma situação para um estado de instabilidade e sensibilidade e, invariavelmente, têm o potencial de trazer prejuízos profundos e duradouros. 

E, apesar de vermos nos noticiários o uso do termo crise para as situações macroeconômicas e políticas, na verdade o espectro da Gestão de Riscos e Crises é muito mais amplo. Hoje, existem dezenas de tipos de riscos mapeados para o setor de hospitalidade. Questões operacionais como, por exemplo, as de segurança patrimonial, segurança alimentar e manutenção são campos para potenciais crises, assim como temas de gestão corporativa, de economia e de políticas públicas, de concorrência, de mudanças climáticas, de segurança de informação, etc. Muitos desses riscos são conhecidos e, portanto, passíveis de prevenção, mas, obviamente, ameaças desconhecidas, de variadas origens e causas, também poderão se tornar crises. 

Hoje em dia, por intermédio de análises de riscos, com históricos e projeções, é possível se antecipar a boa parte dos tipos de ocorrências de grande sensibilidade para as organizações e estabelecimentos de qualquer atividade. Contudo, nesse aspecto, o grande risco verificado é a falta de informação. Gestores de importantes organizações, não dispõem de capacidade de resposta adequada diante de uma ameaça e, menos ainda, diante de uma perda efetiva. O que vemos é que o nível de controle de riscos, muito deficiente na maioria das estruturas, causa uma influência direta na elevação do grau de impacto e probabilidade, ou seja, a falta de preparo amplia os efeitos das crises.     

Como todos sabemos, nem sempre é preciso vivenciar uma perda concreta para sentir seus efeitos. A simples sensação de insegurança, de incapacidade de evitar e reagir diante de algo complexo, já trará impactos relevantes nas concorrências e na escolha por parte dos clientes. Antes, empresas que possuíam estruturas de gestão dos riscos e de crises eram vistas como organizações diferenciadas, hoje as empresas que não possuem essas estruturas sofrem perdas de negócios pela visibilidade negativa. E isso ocorre por, principalmente, 2 fatores: 1- a evolução de tipos de riscos globais de grande impacto; 2 – o aumento das exigências de clientes e de autoridades públicas quanto aos níveis de proteção às pessoas, negócios e imagem.

Instabilidades sociais, econômicas e políticas, falta de água, terrorismo global, ataques cibernéticos, e outros, são exemplos de cenários que nos mostram que vivemos num novo período onde a possibilidade de passarmos por ambientes hostis e desafiadores rompe o nível do provável, e atinge o caráter da inevitabilidade. E apesar de soar como alarmante, essa observação traz em si uma conclusão positiva, pois havendo a consciência da alta probabilidade de crises, se torna cada vez mais possível se preparar para as transpor, e, num segundo momento, se fortalecer com o aprendizado e novo olhar proporcionado pela experiência. 

Nesse sentido, e para que as crises sejam transformadas em crescimento real, o caminho é prevenir e reagir adequadamente. De forma resumida, será essencial para qualquer empresa do setor: definir as ameaças, ter conhecimento de qualquer sinal de uma situação de potencial impacto, saber quais são as prioridades estratégicas para o tratamento do novo contexto, provir a adequada comunicação com a sociedade, com os stakeholders e com os clientes, e por último estabelecer o retorno à normalidade ao fim da crise, incluindo os ensinamentos da experiência no novo ciclo de prevenção. Assim, possuir ou não essa capacidade de ação organizada é uma decisão de responsabilidade exclusiva dos gestores de cada organização, que diz respeito a outros entes, pois extrapola seus próprios prejuízos, e pode significar perdas causadas à terceiros e, inclusive, à economia e ao setor de hospitalidade local. 

A existência de opções viáveis para que as empresas e profissionais possam buscar o cumprimento de suas responsabilidades básicas na prestação de serviços no turismo e na hospitalidade, é indiscutível. A Gestão de Riscos e Crises é uma delas, e depende do cumprimento procedimentos e do envolvimento das pessoas de acordo com cada função. São ações simples e de baixo custo, mas extremamente importantes, e delas dependerá a capacidade de evitar a grande maioria dos problemas graves que ocorreriam caso nada fosse feito.

Hoje é certo que as situações inevitáveis de grande sensibilidade ocorrerão, assim como é certo que o grau de preparação será a chave para a transformação de prejuízos e perdas em ações corretas, em experiência, fortalecimento e reconhecimento de clientes e do mercado de hospitalidade. Pode-se dizer que adequar as capacidades de Gestão de Riscos e Crises é um ótimo investimento, já que a percepção clara do cuidado despendido por cada um dos profissionais do ambiente de hospitalidade na proteção das pessoas, na preservação da saúde dos negócios e da boa imagem de uma organização ou localidade, se converterão certamente em boas experiências, maior satisfação e consequentemente mais e melhores negócios para todos. 

* Otavio Novo é advogado, profissional de Gestão de Riscos e Crises, com 16 anos de atuação em empresas líderes nos setores de serviços, educação e hospitalidade. Durante 6 anos foi responsável pelo Departamento de Segurança e Riscos da Accor Hotels para cerca de 300 hotéis e 15 mil colaboradores em nove países da América Latina.    

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