Quando entro em um hotel na Bahia, percebo imediatamente o aroma do dendê, a textura do barro, o azul que reflete o mar. Em Paris, são as paredes históricas que me contam segredos silenciosos. Em Nova York ou São Paulo, o skyline fala em sutilezas. Mais do que comodidade ou beleza, o que realmente me marca nessas experiências é o sentimento de pertencimento cultural, de estar envolvido em uma narrativa única. Vejo como o uso consciente do design iconográfico — seja através de padrões inspirados em símbolos regionais ou da representação visual de lendas e tradições — transforma hotéis em verdadeiras galerias vivas da cultura local.
O design iconográfico manifesta-se, por exemplo, em azulejos pintados com motivos típicos, em tapetes estampados com grafismos indígenas ou mesmo em mobiliário que faz referência a emblemas históricos. Em Lisboa, você encontra cabeceiras de cama que reproduziam ícones dos azulejos portugueses; em Marrakech, luminárias trazem recortes inspirados na caligrafia árabe. Cada elemento visual narra uma história, permitindo ao hóspede decifrar camadas de significado ao longo da estadia.
Além disso, o uso de imagens é outro recurso fundamental. Obras fotográficas que retratam o cotidiano da cidade, quadros assinados por artistas locais ou até murais pintados por comunidades do entorno vão além do mero embelezamento dos ambientes: eles convidam à contemplação e promovem identificação. Há hotéis que exibem fotografias antigas do bairro, ilustrando a evolução do local, enquanto outros preferem expor arte contemporânea para provocar reflexão sobre a identidade presente.
Cada vez mais, percebo que arte e imagens em hotéis são afirmações de origem e respeito ao contexto. O design deixa de ser neutro para declarar, visualmente, de onde veio e a quem pertence.
Materiais regionais, obras de artistas do lugar, painéis com ícones tradicionais e imagens que evocam o espírito do entorno são detalhes que conectam ao espaço. Nesses hotéis, a arquitetura ultrapassa o abrigo e se transforma em veículo de cultura, um convite para descobrir histórias sem palavras. O design, como vetor de storytelling, revela a alma da cidade e personaliza a experiência de cada visitante.
Vejo uma mudança clara no setor: grandes redes e hotéis independentes rejeitam a estética genérica e apostam em elementos icônicos — desde letreiros estilizados até murais interativos — que valorizam a identidade local. Peças de cerâmica feitas à mão, luminárias que carregam símbolos regionais e painéis ilustrados por artistas do bairro criam laços afetivos e verdadeiros entre o ambiente e quem ali se hospeda.
Os hóspedes de hoje já não buscam reconhecer o hotel, mas sim sentir a cidade dentro dele. O design iconográfico e o uso intencional de imagens, carregados de significado, alimentam essa busca por autenticidade e diálogo com a cultura local. São esses detalhes visuais que me fazem querer voltar — e contar a história do lugar para outros.
Na próxima parte da série, quero compartilhar como tenho visto hotéis se adaptarem ao novo estilo de vida, integrando bleisure, co-living e co-working, e qual o impacto desses movimentos nos fluxos e na arquitetura dos espaços.
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Christophe Bonadona é diretor da ARTEO Estúdio de Design Iconográfico, com sede em São Paulo. Reconhecido por sua abordagem autoral e colaborativa, o estúdio atua em projetos de hospitalidade, lifestyle e arquitetura comercial, traduzindo identidade em forma, narrativa e ambientação. Com mais de 15 anos de experiência e uma visão empreendedora consolidada, Christophe lidera uma equipe multidisciplinar, articulando parcerias estratégicas com arquitetos, marcas e criadores visuais. Com mais de uma década de existência, a ARTEO construiu uma reputação sólida por desenvolver soluções que conectam propósito e espaço, consolidando-se como referência em design emocional e estratégico no setor hoteleiro.
(*) Crédito das fotos: Arquivo Pessoal