Após sete reduções seguidas na taxa Selic, o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC (Banco Central), decidiu fazer um pausa no ciclo de cortes. Com isso, em decisão unânime, a taxa básica de juros foi mantida em 10,50% ao ano, aponta o G1. Para analistas, o cenário ameniza a percepção de uma divisão política dentro do BC e indica que decisões tendem a ser tomadas com base em aspectos técnicos.

A decisão veio em linha com as atuais expectativas do mercado, mas ainda representa uma previsão maior de juros para 2024 em relação ao observado no começo do ano. Na hotelaria e turismo, essa realidade pode significar menor demanda por serviços turísticos e hospedagem, uma vez que tanto os investimentos em novos empreendimentos, quanto os gastos dos consumidores, são afetados.

Para o mercado, tão importante quanto a própria decisão do colegiado foi o fato de ela ter sido unânime, visto que a reunião anterior do Copom, realizada em 8 de maio, foi marcada por uma divisão de votos, com os antigos diretores querendo um corte de 0,25% na Selic, enquanto os novos votaram por 0,50%. Neste cenário, prevaleceu a primeira opção.

À época, a decisão elevou os receios dos analistas de que os novos diretores pudessem optar por uma condução mais frouxa da política monetária, em linha com o que é esperado pelo governo. Por isso, o novo movimento foi visto com alívio por investidores.

Retomada de confiança

Para Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura Investimentos, o movimento sugere que os novos diretores, indicados pelo presidente Lula, estão alinhados com uma postura mais cautelosa do Copom neste momento.

“Sendo assim, o mercado deve pedir menores prêmios na curva de juros, uma vez que um dos riscos para a decisão desta quarta-feira era uma percepção de leniência dos novos diretores. Isso, portanto, deve contribuir para a queda das taxas de juros e do câmbio”, diz.

Ainda de acordo com ele, esse alívio na Selic e no câmbio deve reduzir também a pressão de venda na bolsa de valores brasileira, contribuindo para a recuperação do Ibovespa, principal índice acionário.

Economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese também acredita que a decisão unânime tende a colaborar com um alívio no mercado, mesmo que momentâneo. “Essa unanimidade pode contribuir para um alívio momentâneo no mercado, tirando um pouco do foco o fato de haver uma divisão política no Banco Central”, analisa.

Por que o BC interrompeu o ciclo de cortes?

Segundo economistas, o principal motivo para a pausa nos cortes da Selic foi a maior desancoragem das expectativas de inflação. “A desancoragem que já existia na semana passada aumentou. E não aumentou pouca coisa, aumentou muito” diz Andrea Damico, economista-chefe da Armor Capital, reiterando que as últimas sinalizações dos diretores do Copom também indicam esse como o principal fator para a tomada de decisão.

Segundo comunicado divulgado após a decisão, o colegiado afirmou que o ambiente externo se mantém adverso “em função da incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e quanto à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países”.

Os diretores também afirmaram que o conjunto de indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho brasileiro continuam apresentando um “dinamismo maior do que o esperado”. Entre os fatores de risco de alta da inflação citados pelo Copom no comunicado, estão maior persistência das pressões inflacionárias globais, além de uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada.

Política monetária internacional

Do lado do exterior, dizem especialistas, o ambiente mais adverso em meio às crescentes incertezas sobre a política monetária internacional – principalmente nos Estados Unidos – continuou na mira do BC.

Em sua última reunião de política monetária, o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) decidiu mais uma vez manter os juros do país inalterados na faixa entre 5,25%, e 5,50%, destacando que não considera dar início aos cortes de juros até que tenha “maior confiança de que a inflação está evoluindo de forma sustentável para 2%”.

Além disso, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) ainda voltou a dizer que está “preparado para ajustar a orientação da política monetária conforme apropriado caso surjam riscos que possam impedir o alcance de seus objetivos.”

Futuro da Selic

No comunicado, o Copom também afirmou que a conjuntura atual já sinaliza um processo desinflacionário mais lento e indica ampliação de desancoragem das expectativas de inflação em meio a um cenário global desafiador. Esse cenário, de acordo com o colegiado, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária por parte da instituição.

Além disso, o Comitê ressaltou que o cenário global incerto e o doméstico marcado por resiliência na atividade, além da elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas, demandam maior cautela.

“A política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”, afirmam os diretores.

O que a taxa atual representa?

De acordo com artigo publicado na Bloomberg Línea, a Selic em dois dígitos aumenta a pressão sobre empresas endividadas. Isso porque as companhias que contraíram dívidas em momento de juros baixos agora se preparam para uma nova realidade: taxas de juros de dois dígitos por mais tempo do que o esperado.

Dessa forma, o ciclo de flexibilização do BC parece caminhar para um fim prematuro. Com a decisão do Copom, os custos de empréstimos permanecerão acima de 10% no futuro previsível. Isso representa um desafio adicional para empresas que possuem dívidas de taxa flutuante adquiridas quando as taxas estavam em níveis historicamente baixos, em torno de 2% ao ano durante a pandemia.

Executivos planejavam que as taxas diminuíssem, o que permitiria refinanciar os empréstimos. As empresas brasileiras enfrentam vencimentos de R$ 81 bilhões em debêntures em 2025 e R$ 128 bilhões em 2026. Outros R$ 18 bilhões vencem até o final de 2026 em notas emitidas nos mercados internacionais.

(*) Crédito da foto: Reprodução/Folhapress