A Peic (Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor), realizada pela CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), registrou pela primeira vez, desde fevereiro deste ano, uma queda no endividamento das famílias brasileiras.

Em julho de 2024, 78,5% das famílias relataram ter dívidas a vencer, uma redução de 0,3 ponto percentual em relação ao mês anterior. Apesar da queda, esse percentual ainda está acima do registrado em julho do ano passado, que foi de 78,1%. Entre os meses de maio e abril, houve um recuo de 0,2 ponto percentual, o que antecede à estabilidade de endividamento revelada em junho.

O relatório revela que a estabilidade no indicador de endividamento das famílias reflete uma postura mais cautelosa. O cartão de crédito continua sendo a principal modalidade de dívida, utilizado por 86% dos devedores. No entanto, o financiamento imobiliário apresentou o maior crescimento, com um aumento de 1,4 p.p. em comparação ao ano anterior, alcançando 9,1%, o maior percentual desde fevereiro de 2022. Isso se deve ao mercado de crédito mais acessível, com juros mais baixos.

A redução no endividamento geral foi impulsionada principalmente pelas mulheres, cujo nível de endividamento caiu 0,8 p.p. em comparação ao mês anterior, igualando-se ao de julho do ano passado. Em contrapartida, o endividamento dos homens permaneceu estável em relação a junho e 0,8 p.p. acima do registrado em julho de 2023.

O presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, José Roberto Tadros, destacou que o endividamento nem sempre é negativo, pois pode indicar maior acesso a recursos financeiros para consumo, aquecendo o comércio e a economia. No entanto, ele alertou para os riscos quando o consumidor não consegue pagar suas dívidas em dia, enfrentando dificuldades com crédito e altas taxas de juros que agravam a situação financeira.

Estabilidade na inadimplência

A inadimplência manteve-se estável em julho, em 28,8%, e caiu 0,8 p.p. na comparação anual. Além disso, o percentual de famílias que não conseguirão pagar suas dívidas em atraso diminuiu para 11,9%, uma redução de 0,1 p.p. em relação ao mês anterior e 0,3 p.p. comparado a julho de 2023. Contudo, o percentual de famílias com dívidas atrasadas por mais de 90 dias aumentou 0,3 p.p., atingindo 47,9% do total de endividados, o maior desde novembro de 2023.

Felipe Tavares, economista-chefe da CNC, observou que a estabilização das famílias com dívidas atrasadas e a ligeira queda naquelas sem condições de pagar indicam uma leve melhora nas finanças familiares. Ele destacou que as famílias estão comprometendo uma porcentagem menor de sua renda para pagamento de dívidas, com a média de 29,6% em julho, sendo o quinto mês consecutivo de retração.

Projeções da CNC indicam que o endividamento deve cair nos próximos dois meses, mas aumentar novamente no final do ano, com uma taxa esperada de 78,4% em dezembro. A inadimplência também tende a crescer gradualmente, podendo alcançar 29,5% até o fim do ano.

Análise por renda

Ao analisar os dados por faixa de renda, observou-se que as famílias com rendimentos de até três salários mínimos e entre três e cinco salários mínimos tiveram uma redução no endividamento de 0,3 p.p. e 0,5 p.p., respectivamente, fechando o mês em 81% e 79,6%. No entanto, a inadimplência nessa faixa de renda aumentou 0,3 p.p. e 0,9 p.p., totalizando 36,8% e 27,1%. O percentual de famílias que não conseguem pagar suas dívidas também cresceu, com 17,4% das que ganham até três salários mínimos (aumento de 0,4 p.p.) e 10% das que recebem entre três e cinco salários mínimos (incremento de 0,2 p.p.).

Impacto das enchentes no Rio Grande do Sul

As enchentes no Rio Grande do Sul contribuíram para um aumento no endividamento das famílias da região, que alcançou 91,2%, o maior nível desde outubro de 2023. Em julho, 38% das famílias estavam inadimplentes, o maior índice desde janeiro deste ano, e 3,3% dos consumidores não tinham condições de pagar suas dívidas, o maior percentual desde agosto de 2021. As dificuldades enfrentadas no comércio e no mercado de trabalho local refletem-se na ICF (Intenção de Consumo das Famílias) e no Icec (Índice de Confiança do Empresário do Comércio), também apurados pela CNC.

(*) Crédito da foto: Pixabay