Mateus Cabau

Por que esse modelo ainda não repete esse tamanho potencial de expansão do mercado americano no Brasil? Primeiramente, devemos considerar o tamanho das duas economias e consequentemente o poder de compra da sua população. O PIB Americano em 2019 foi U$ 21.4 trilhões. Já o do Brasil  foi de U$ 1.6 trilhões, ou seja, os Estados Unidos tem um PIB 13 vezes maior que o nosso.

Posteriormente, como qualquer investimento devemos observar os seguintes fatores: oportunidade, risco, exposição de caixa, estabilidade econômica, segurança jurídica e contábil. O fator que considero fundamental é o  acesso a crédito/financiamento. Aqui nos Estados Unidos isso é mais rotineiro e trivial. A hotelaria aqui se desenvolve alavancada no financiamento imobiliário, ou melhor, o mercado imobiliário americano se desenvolve por meio de financiamentos bancário imobiliário.

Um outro paralelo que ouso a fazer é que até poucos meses atrás o Brasil era um país muito interessante (atrativo) para a aplicação de recursos. Uma sólida instituição financeira, onde era possível aplicar e obter um rendimento de 10% a.a. com baixo risco. Por que o empreendedor conservador entraria em um risco de negocio como o hoteleiro?

Aqui nos EUA a versão do CDB brasileiro rende menos de 0,5% ao ano. Você acredita que o americano deixa o dinheiro aplicado aqui ou vai empreender em franquias de fast food, hotéis, imóveis para locação e/ou bolsa de valores?

É muito recente a nova realidade de taxa de juros brasileira. Talvez agora começamos a cultura de empreender pois não é mais atrativo deixar o dinheiro rendendo 4% ao ano. Mas o que gostaria de também registrar é que não é um “fardo” que apenas a hotelaria carrega. Vejam os números, por exemplo, da indústria americana de fast food. 

  • Revenue aproximadamente US$ 300 bilhõees em 2019;
  • Mais de 199 mil franquias em operação, totalizando aproximadamente 240 mil operações, considerando as lojas próprias;
  • Centenas de marcas estão presentes no mercado norte-americano contra talvez uma dezena de marcas no mercado brasileiro? McDonald’s; Starbucks; Subway; Taco Bell; Chick-fil-A; Wendy’s; Burger King; Dunkin’; Domino’s; Panera Bread; Pizza Hut; Chipotle; Sonic Drive-In; KFC; Arby’s; Little Caesars; Dairy Queen; Jack in the Box; Panda Express; Popeyes; Papa John’s; Whataburger; Hardee’s; Zaxby’s; Five Guys; Culver’s; Carl’s Jr.; Bojangles’; Steak ’n Shake; In-N-Out Burger; El Pollo Loco; Qdoba; Del Taco; Firehouse Subs; Marco’s Pizza; Boston Market…

Se olharmos para o sistema financeiro, a quantidade de bancos que o mercado americano tem versus a quantidade de bancos que o Brasil oferece. Podemos fazer a mesma analogia para as companhia aéreas, concessionárias de automóveis, grades lojas de departamentos, quantidade de universidades etc.

Voltando à hotelaria, seguem alguns números do mercado americano:

  • De 2009 a 2019 o crescimento do REVPAR americano foi constante. São 10 consecutivos anos de incremento! 
  • São mais de 50 mil hotéis em operação em todo os EUA (talvez 5,5 mil no Brasil) com mais de 465 milhões de pessoas viajando durante o último ano de 2019 dentro do território americano. A título de curiosidade, só no feriadão de thanksgiving (Ação de Graças) o fluxo de passageiros em aeroportos americanos equivale a 35% do fluxo anual de passageiros em aeroportos brasileiros. 

Enfim, acredito que tudo isso justifica a diferença de tamanho do mercado de FRANQUIAS entre os dois países. Portanto, nós hoteleiros, não devemos ficar com essa “culpa” mas, sim devemos  lamentar que o tamanho da nossa indústria nos limita em oportunidades de emprego, crescimento profissional e remunerações.

Estimo que 70% da hotelaria americana opera com alguma bandeira hoteleira e entendo que no Brasil temos um número inverso, ou seja, olhando o copo meio cheio, vejo isso como uma tremenda oportunidade. E aí vem a pergunta do milhão: o que precisa ser feito?

Primeiramente a master franqueadora precisa querer desenvolver esse modelo de negócio e estruturar o suporte aos franqueados. Eu pessoalmente sou fã de uma bandeira, uma marca e vejo muito mais prós do que contras e, não é a toa que participo de dois empreendimentos aqui nos EUA. Ambas estão com franquias de bandeiras, ou seja, compramos a franquia para as duas propriedades. 

Antigamente o grande diferencial ao optar por uma franquia era estar no portfólio de uma grande rede hoteleira pela sua exposição, visibilidade global e facilidade de booking via os GDS. Hoje o benefício da exposição do produto via marca é questionável porque temos as OTAs. Porém, a adesão a uma marca ou bandeira nos permite a prática de comissões menores junto as OTAs, algo que um hotel independente e a franquia continuam com o beneficio da exposição de venda global junto a marca e seu hóspede/cartão de fidelidade.

A opção pela franquia tem também um beneficio operacional. Entendo que possibilita o “up date real” das tendências hoteleiras, a frequente atualização do seu produto, um suporte de TI e condições comerciais com importantes “vendors” reduzindo o custo operacional. Além disso, o comportamento do franqueado é muito importante para o sucesso dessa parceria, não pode ser uma relação passiva, tem que estar “fechado” em defender os valores da marca que ele comprou, tem que ser uma relação ativa de duas mãos. 

Outros serviços que um franqueado pode ter, se for de interesse da franqueadora é serviço de contas a receber/faturamento; banco de currículos; treinamentos específicos; revenue management; entre outros.

Franquia permite ao proprietário o maior foco na operação, no seu mercado primário e na suas finanças.

Acredito que o mercado brasileiro tem uma oportunidade para esse modelo de negócio .

Antes de concluir não poderia deixar de registrar que sim, marcas independentes são capazes de ter muito sucesso e suas operações serem mais rentáveis. Podemos citar inúmeros empreendimentos hoteleiros, principalmente aqueles que são reconhecidos como hotéis-boutique” e/ou estão em destinos consolidados e ou menos competitivos. 

O fato é que para franquia e ou marca independente o conhecimento do seu produto, mercado, do seu guest é essencial para o sucesso do negócio!

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Com passagens pela Marriott e Atlantica Hotels e com mais de 20 anos de experiência em gestão hoteleira, Cabau está focado, nesses últimos, no desenvolvimento imobiliário hoteleiro, assumindo posições na liderança de pessoas. Em 2014, mudou com a família para os Estados Unidos. Após um ano, instalaram-se Orlando, Flórida, um dos maiores destinos turisticos do mundo. Nos últimos cinco anos, participou como investidor e desenvolvedor de um hotel lifestyle. O empreendimento de 154 UHs, vizinho ao Outlet Premium em Lake Buena Vista, tem previsão de abertura para março de 2021. Paralelamente atua como gerente geral de um hotel na região da International Drive, em Orlando.

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