César Nunes fala sobre turismo,
hotelaria e as prospecções para o futuro
(fotos: Peter Kutuchian)
 
Ao perguntar a César Nunes se, como hoteleiro, ele é um hóspede chato, recebo uma resposta bem humorada: "Sou turista do off road, gosto de andar de moto. Quem trabalha em hotel não gosta de ficar neles". Recebemos o executivo na redação do Hôtelier News uma semana após ele assumir o cargo de diretor comercial da Royal Palm Hotels & Resorts para uma conversa sobre o mercado profissional, a hotelaria e o turismo, e sua carreira.
 
Graduado em Turismo pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Nunes conta que, já na faculdade, se interessou pela hotelaria. Procurou, então, uma formação mais específica na área, optando pelo Centro Europeu de Curitiba, para estudar Administração Hoteleira. "Acho importante se reciclar, sempre", diz. Seguindo este mote, ele ainda cursou Gestão Estratégica em Vendas na Imec, também na capital paranaense, e atualmente é aluno do MBA de Gestão Empresarial da Fundação Dom Cabral.
 
Completando 11 anos de atuação no turismo, passou por importantes redes como Atlantica Hotels International e o Grupo Pestana, onde era gerente geral de Vendas América do Sul. Após ter dedicado sua vida profissional ao setor de vendas na hotelaria, decidiu acrescentar em seu currículo uma vivência diferente, e foi para a Trend. Durante um ano, esteve à frente do departamento de Marketing e Vendas da operadora. "Foi uma experiência interessante, tenho uma visão diferente de meu trabalho hoje", conta. O coração de hoteleiro bateu mais forte e Nunes voltou para sua área, agora integrando a equipe do Royal Palm.
 
Por Juliana Bellegard
 
 
Hôtelier News: Como e por que você decidiu sair da hotelaria?
César Nunes: Minha carreira sempre foi na hotelaria, passei por diversas redes, mas havia uma curiosidade com o trabalho de distribuição. O convite para trabalhar na Trend aconteceu depois de um longo namoro, fui chamado por um dos acionistas que é, inclusive, amigo meu. A operadora estava passando por um processo de reestruturação e abriu o novo cargo de diretor de Marketing e Vendas. Foi um risco, pois estava em um momento muito bom na Pestana. 
 
HN: O que a experiência na Trend agregou para sua formação profissional?
Nunes: Dentro da hotelaria, meu leque de contatos era muito amplo, falava com fornecedores, agências, clientes. Com a ida para a Trend, pude ter mais contato com operadoras e agências,
pude conhecer mais a fundo o funcionamento deste mercado. Hoje, tenho uma visão melhor da distribuição. É uma relação interessante, principalmente porque a Trend tem uma equipe grande, o approach no Brasil é diferente, muito mais rico. Claro que, por outro lado, senti falta de produto, pois ela é só uma intermediária.
 
 
HN: Quais os principais desafios das operadoras e agências de viagens hoje?
Nunes: O grande desafio é a disponibilidade. Intermediar uma compra, atualmente, é muito difícil por conta da internet. Essa geração não compra com intermediários, vai direto no online. O consumidor pesquisa sobre o destino, o hotel, entra no Trip Advisor para ler as resenhas. Ele confia muito mais no depoimento de outros usuários do que no material promocial que as agências oferecem. Não se pode mais ser apenas uma fazedora de pedidos, tem que prestar atenção na mudança de perfil dos consumidores. Mesmo a classe C, que vem crescendo, vai migrar para a internet se houver oferta de crédito e percelamento. Aquele que investir na web vai sobreviver.
 
HN: Fala-se muito na relação de dependência entre os hotéis e as operadoras. Onde está o equilíbrio?
Nunes: A hotelaria tem que saber trabalhar com segmentação de mercado, não pode deixar tudo na mão das operadoras. É preciso atingir diferentes nichos, vender para vários públicos. Equilíbrio perfeito não existe, pois cada mercado exige um trabalho diferente. Claro que, quanto mais aberto for seu leque de opções, maior a chance de sucesso. Natal, por exemplo, é um destino bastante procurado por estrangeiros, mas não dá pra ficar só com isso. Qualquer oscilação de dólar ou mudança econômica pode afetar as vendas. Quanto mais recessivo é o mercado, mais dependente é a relação com a operadora, ela tem distribuição, é uma comodidade. É preciso buscar paridade tarifária, e investir no próprio canal de vendas – o site do hotel. As operadoras crescem por conta de seu sistema de vendas e reservas. O hotel precisa disso, de um sistema próprio que rode dentro de seu website e seja integrado com o operacional.
 
 

 
HN: Onde se encaixa o revenue management?
Nunes: Muitos hoteleiros confundem RM com e-commerce, e muitas vezes quem mexe com e-commerce acaba acumulando funções. O RM gerencia todos os canais, e as vendas online são um destes canais. É ele quem decide a oscilação e colocação de tarifas. Dependendo do hotel, do seu tamanho e volume de negócios, vale a pena sim criar um cargo específico para o revenue manager, alguém com conhecimentos específicos para isso e não tirar um profissional de dentro do hotel. É preciso haver uma sinergia entre o Marketing, a Comunicação, Vendas e RM.
 
HN: Em quais aspectos a hotelaria pode melhorar?
Nunes: A principal mudança do mercado é a venda online – antes, era tudo muito preso aos GDS. Hoje não precisa disso, é direto, o mercado nacional virou muito para as OTAs (Online Travel Agencies). A hotelaria tem demorado para acordar para este novo panorama. A deficiência dos hotéis em geral é o site. Falta imagem, formulários, sistema de reservas, motor de pagamento. Com a internet, o hoteleiro tem a oportunidade de compreender o consumidor, e ver o que ele está falando sobre o seu hotel. Você não pode controlar a opinião dele, mas pode responder os comentários, acompanhar. Se a opinião fica solta, prejudica a imagem do hotel. 
 
  
 
HN: Pensando nisso, os sites de hotéis devem ter uma seção de comentários dos clientes?
Nunes: É uma situação delicada, mas acho que deve ser feito sim. É preciso ter também um espaço para que a gerência possa se posicionar frente a cada opinião, dar um feekback para os usuários. Ao mesmo tempo, é preciso deixar claro que não é um conteúdo controlado ou censurado.
 
HN: O trabalho com mídias sociais pode ajudar nas vendas?
Nunes: São um ótimo canal de divulgação, mas ainda não são um canal de vendas. As mídias sociais permitem uma interatividade muito maior com os usuários, pode ajudar inclusive na segmentação do mercado, atingindo um determinado público com ações mais focadas. Elas acabaram substituindo, em parte, o anúncio tradicional exatamente por conta disso. Recomendo o livro Vai Fundo!, de Gary Vaynerchuk, que fala sobre as possibilidades de usar a internet para os negócios.
 
HN: Que mudanças as novas tecnologias podem promover dentro dos hotéis?
Nunes: O check-in em hotéis ainda esbarra na burocracia. O desenvolvimento de plataformas para smartphone é uma forma de contornar isso, há pessoas que ficam muito mais tempo no celular do que na frente de um computador. Acho que ainda estamos longe de abrir as portas com o celular, mas há avanços nessa área também. No próprio The Palms, um de nossos hotéis, não existe mais a necessidade de inserir o cartão na porta, você apenas o aproxima e ela abre.
 
 
 
HN: Quais os seus principais desafios na diretoria da Royal Palm Hotels & Resorts?
Nunes: Manter a demanda constante. Trabalhamos com o público de eventos e, por isso, a ocupação oscila, o mercado varia muito. O desafio é convencer o paulistano que Campinas também pode ser um destino de lazer. E, claro, buscar a melhoria nos resultados da rede como um todo. É uma empresa muito séria, o Antônio Dias ( diretor executivo da rede ), conhece o mercado, é bastante preparado. A rede vai crescer, já há planos para hotéis em outros destinos.
 
HN: E suas metas como profissional, independente do emprego em que esteja?
Nunes: Eu gosto muito do setor de vendas, da dinâmica, da falta de rotina. Busco sempre me inteirar do que está acontecendo no Brasil e no mundo, pois acredito que tudo pode gerar demanda para um hotel. Também gosto de passar o que aprendo para os outros, capacitar, formar pessoas, e trocar experiências com outros profissionais. A partir do momento que você acha que tem a verdade absoluta, você começa a emburrecer.
 
HN: O que busca nos colaboradores que trabalham com você?
Nunes: Em minha equipe eu quero pessoas que queiram crescer, tenham sangue nos olhos, vontade de produzir resultados. O hotel é um produto perecível, vendas em hotelaria é perecível, tem que batalhar sempre pelos seus resultados. Além disso, tento oxigenar a equipe – não trocar de colaboradores, mas fazê-los pensar em coisas novas, realizar um treinamento fora do hotel. Essa renovação é muito importante.
 
 
HN: O mercado de trabalho corresponde a essa expectativa?
Nunes: Hoje, faltam profissionais qualificados. Percebi isso durante o período em que fiquei parado, recebi diversas propostas para atuar nas mais diferentes áreas. O começo de carreira é sempre complicado, não se entra direto nas posições que se deseja. É preciso ter foco, definir o que você quer para sua carreira e trabalhar em cima disso. Uma coisa é gostar de hotelaria, que
engloba muitas coisas, outra coisa diferente é traçar um objetivo.
 
HN: Você mencionou que a Royal terá novos empreendimentos. Ainda há espaço para novos hotéis?
Nunes: Em alguns destinos, com São Paulo por exemplo, a hotelaria concorre com o setor imobiliário, não há mais espaço para se construir hotéis, e os terrenos estão muito caros. Mas as oportunidades estão aí, é preciso olhar para outros mercados. Brasília, Belo Horizonte, são praças que ainda têm excesso de demanda.
 
 
HN: O mercado se recuperou da crise de 2009 e hoje a hotelaria tem resultados surpreendentes. Ainda é preciso ter cautela, ou se pode aproveitar o momento?
Nunes: Acredito que, nos próximos três anos, não haverá mudanças drásticas no mercado, a hotelaria está de fato bastante aquecida. Se tivesse que dar um recado para os hoteleiros, principalmente os novos, seria o seguinte: aproveitem o momento para rentabilizar, fazer um RM forte, buscar investimentos, e não se prender a um canal só. Diversifiquem seus canais.
 
Contato