Alexandre Gehlen
(fotos: Aline Costa e Peter Kutuchian)
  
Fim de ano é tempo de balanço. A tendência quando chega dezembro é que todas as pessoas fiquem mais reflexivas, lembrando das conquistas do período e pensando no que pode melhorar nos meses seguintes.

E vivemos um tempo particularmente especial: é o fim do primeiro ano de mais uma década. Fica difícil resistir a comparações em relação aos cinco anos anteriores e aos cinco que estão por vir. Ainda mais levando-se em conta que daqui até 2015 o Brasil vai sediar dois grandes eventos esportivos – Copa 2014 e Olimpíada 2016 – bem como uma série de outras atividades que são realizadas por conta dessas ações.

Há cerca de três semanas, assistimos à derradeira grande feira do ano do setor: o Festival de Turismo de Gramado. Por conta do evento, tivemos a oportunidade de aproveitar a viagem para o Sul e encontrar Alexandre Gehlen, diretor geral da InterCity, na unidade Express de Porto Alegre e relembramos uma entrevista especial publicada no Hôtelier News em 19 de dezembro de 2005.

Na ocasião, Gehlen contou que sua "carreira começou" aos nove anos, quando já ajudava a avó Frida na pousada que hoje é o respeitado Hotel Bavária, localizado em Gramado, Rio Grande do Sul. Ele falou também que a ideia de criar a rede surgiu em 1999, quando Gravataí recebeu a montadora General Motors e ele identificou a demanda hoteleira que surgia ali.

"Criamos uma rede inteligente e esse termo norteia nossa gestão e nosso atendimento, além de envolver o uso de tecnologia", reforça sobre o conceito da marca. Ainda segundo ele, inteligência é "fazer mais por menos. Seu hóspede tem que sair com a impressão de ter recebido mais do que pagou". E brinca: a vida é muito curta para as pessoas se hospedarem em hotéis baratos!

 
Nossa nova conversa retomou alguns pontos tratados naquele ano, além de abordar outros assuntos. Vamos conferir.

Por Aline Costa

Hôtelier News: Em 2005, você apontou três pontos críticos para o desenvolvimento do setor no país: infraestutura, segurança e promoção. E hoje?
Alexandre Gehlen: A gente só não é um país de turismo robusto por falta de infraestrutura e mobilidade. Esse é o gargalo. Hoje está mas barato viajar de avião e as pessoas vão e voltam com uma frequência maior. Há cinco anos o aeroporto de Belo Horizonte, por exemplo, estava às moscas, hoje já é pequeno. Melhorou a frequência e o volume de voos, mas isso ainda não acompanha a demanda, além das condições de viagem do passageiro terem piorado. Contudo, temos aí um grande evento a caminho que veio dar um prazo para as obras necessárias. O que levaria 20 anos para ser feito, agora precisa estar pronto em quatro. Os políticos sabem dessa responsabilidade, o que é uma vantagem.

Quanto à promoção, o País passa por uma fase na qual é bem visto no exterior e tem também um mercado interno fortalecido, que consume mais viagens. E em relação à segurança, de 2005 pra cá, esta tem sido a quinta, sexta preocupação em relação a hospedagem de acordo com as pesquisas. Não vejo mais isso como determinante, embora seja uma questão relevante.

HN: Há cinco anos, você comentou que, na ocasião, começava a época de ver o lucro dos empreendimentos. Isso se concretizou?
Gehlen: Tu vês na infraestrutura também maior visibilidade para o setor. Em 2005 éramos ridicularizados pelo mercado investidor e hoje nosso negócio já é mais respeitado por eles.

Eu estou confiante que se o governo federal manter a linha de crescimento entre 3% e 3,5% durante três ou quatro anos, o turismo e o nosso negócio irão mudar de patamar.

Desde o ano passado a hotelaria é vista com melhores olhos e o crescimento está compatível com as nossas expectativas. O hoteleiro e o investidor podem ser mais agressivos porque confiam no crescimento, sabem que não vai existir superorferta. As pessoas estão mais informadas, sabem que se fizerem um hotel em determinada cidade que não tem demanda, vão brigar e perder dinheiro. Isso nos motiva a dobrar de tamanho. Quem falava em investidor qualificado em 2005? Hoje, isso já é real.

Para atingirmos um valor mais próximo do ideal, a diária média deve crescer de 20% a 30%, um valor adequado para remunerar a aquisição do ativo, porque o econômico ainda não consegue se viabilizar.

HN: Você acredita que o próprio consumidor também valoriza mais o produto hotel?

Gehlen: Hoje o cliente respeita mais, não se atende mais o telefone com gente pedindo desconto. Pessoas ligam procurando por um apartamento.  

Entre 2002 e 2005 pagava-se mais caro no jantar do que se paga no hotel. Agora está decente a relação. Hoje você continua pagando R$ 160 no jantar, mas se hospeda por R$ 250.

Além disso, estamos conseguindo segmentar o mercado. Eu sei que vou me hospedar no econômico por R$ 160, no midscale por R$ 220. Ano passado era R$ 160 no midscale.

 

HN: Você acha que seria válida a criação de uma lei para regulamentar o mercado proibindo a construção de hotéis em locais onde não há demanda?
Gehlen: Como hoteleiros, nos cabe monitorar, acompanhar, dirigir. Muita informação é a solução para regularizar o setor. Seria interessante criar ferramentas jurídicas que limitassem a construção de hotéis em áreas que não possuem demanda, mas não há consenso. Assim, a solução é termos um investidor qualificado, quanto mais informação, mais o player individual será qualificado. Se a lei de mercado prevalecer, estará tudo bem.

HN: O Fohb – Fórum dos Operadores Hoteleiros do Brasil -, grupo do qual você é um dos diretores e do qual a InterCity faz parte, ajudou nessas conquistas?

Gehlen: O Fohb tem ajudado muito nisso. No começo, todos eram concorrentes, havia muitas brigas entre as redes. Hoje somos todos parceiros, um grupo muito unido, onde impera o respeito mútuo e são realizadas ações concretas que vão trazer benefícios. A recuperação do setor e da diária média seria mais modesta se não fosse esse trabalho de monitorar o crescimento, acompanhar lei geral do turismo e fazer inserções importantes.

HN: A InterCity deve diversificar os negócios e apostar no segmento de lazer?
Gehlen: Se por um lado não podemos colocar todos os ovos em uma mesma cesta, por outro, podemos dizer que quem diversifica não sabe o que quer. Sabemos muito sobre a área na qual atuamos. O risco número um da hotelaria urbana é a falta de crescimento do país. O número dois é a super oferta.

No lazer os riscos são diferentes e a gente conhece um pouco menos: câmbio, destino cansado, turismo predatório, a expectativa é outra, enfim, são outras questões que preferimos não lidar no momento.

Contudo, alguns hotéis em cidades nordestinas e praianas como Florianópolis e João Pessoa tendem a trocar de público em determinadas épocas do ano. Você vê claramente que o hóspede troca o blazer pelo calção. Então nossas salas de eventos viram kids club e abrimos o bar da piscina, por exemplo.

HN: Observamos uma grande ascenção de brasileiros que passaram a fazer parte da classe média. E o mercado de luxo, você acha que vai se desenvolver mais também?
Gehlen: Está complicado porque ainda somos um país pobre. Agora somos 40 milhões que compra carro, lê sua coluna, mas por enquanto esse contingente está mais centralizado no Rio e em São Paulo. E nessas cidades o valor do imóvel em áreas nobres é muito caro.

Nosso país ainda é muito jovem, recém saiu de uma ditadura, recém saiu de uma inflação galopante. Eu fui ver a economia crescer continuamente agora que tenho 44 anos. Vai levar muito tempo para nosso mercado conseguir dar suporte para uma hotelaria como a que vemos nos Estados Unidos, por exemplo.

Contudo, esse desafio é prazeroso. Lembro que quando estava definindo o que queria da vida, cheguei a cogitar ir morar na Europa. Então minha avó disse: pense bem, lá na Alemanha já está tudo feito, não há muitas coisas novas a se buscar. Já o Brasil tem muitas oportunidades, ainda está sendo construído e você pode fazer parte disso.

HN: E falando especificamente sobre Porto Alegre, onde vocês estão sediados, como você analisa o mercado da região?
Gehlen: Porto Alegre soube superar a superoferta no pior momento da hotelaria. Soube usar as informações do Sindicato e da ABIH local para não sofrer com a super oferta, como aconteceu em São Paulo, e hoje estamos em um momento excelente para o hoteleiro, embora para o consumidor seja desconfortável não achar hotel para ficar.

Para que a região evolua ainda mais, acho que o Cais do Porto é mais importante que a Copa do Mundo. Acredito que esse projeto vai fortalecer o mercado de negócios – que é o que temos de melhor e ainda ajudar a melhorar a ocupação nos finais de semana. Contudo, não faz sentido a gente querer virar uma capital de lazer, não somos isso. Mesmo na área cultural ainda temos muito para andar.

HN: Ano que vem a InterCity vai administrar um hotel no Uruguai. Por que este país foi escolhido?
Gehlen: Primeiro, pela proximidade. Daqui do Sul estamos mais perto de Montevideo que de São Paulo. Além disso, uma rede brasileira é convidativa. Aos olhos dos investidores locais é melhor ter uma empresa brasileira administrando, que tem mais emissor de mercado para lá do que outras redes. Esse é o norte deles. Vendo outros hotéis e negócios de lá, encontramos uma coisa ou outra da Argentina em prospecção, mas o maior interesse é mesmo pelo Brasil.

 
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