Sérgio Luppi, profissional deveras respeitado no mercado brasileiro
(fotos: Peter Kutuchian)
No final da década de 1960 e início da década de 1970, a aviação vivia seu momento de crescimento. Aumentavam a tecnologia, o interesse, e principalmente os investimentos. Nesta época a Varig comprou as rotas da Panair para a Europa e se tornou a maior empresa brasileira no segmento. Vasp e Transbrasil aumentaram e modernizaram suas frotas. Nos aeroportos, se via o glamour de passageiros e dos comissários, sempre elegantes com suas luvas e casquetes, cumprimentando com toda elegância os que subiam a bordo.
Neste clima, um jovem recém-saído do exército entrava para o mundo do turismo. Ainda de cabeça raspada, Sérgio Luppi comecou a integrar a equipe operacional da Varig, e depois seguiria para vendas, reservas e também para o grupo de treinamentos, em que assumiu o cargo de chefia. Foram 11 anos de empresa. Luppi, que já falava bem espanhol e inglês, passava horas no aeroporto de Congonhas e chegou até a atender no balcão de check-in.
Paralelo às lições de mercado, Luppi estudou História na Puc e fez uma pós no assunto. Ele lecionou a matéria à noite em colégios públicos, de 1973 a 1996. Para complementar a formação, também fez um curso de Administração Escolar.
 
A década de 1980 chegou, e junto com os teclados sintetizadores, Luppi seguiu para a Transbrasil, em que assumiu cargos executivos. “Passei um ano e meio dividindo meu tempo entre Miami, Orlando, São Paulo e Brasília”, conta. “Hoje estou no meu 6º passaporte, entre validades e preenchimentos”, completa. Nesta época, Luppi já tinha se apaixonado por gente e por serviço. “Sempre gostei muito de atendimento”. O executivo gerenciava 500 pessoas, quando exerceu a função de gerente de divisão da empresa aérea.
Veio o Plano Collor e o executivo sofreu um grande baque. “Voltei à sala de aula e fiquei um ano como professor. A hotelaria começou a se desenvolver bastante e surgiu uma oportunidade em um rent a car, em 1990. Porém, fiquei apenas 3 meses”, explica.
 
Nesta época, a Accor estudava a criação de sua primeira central de reservas, focando a marca Novotel. “O departamento era formado por quatro pessoas e um gerente. Eu tinha experiência em reservas de aviação, que era mais desenvolvida, isso ajudou para que eles me fizessem o convite para ser gerente da central de reservas, responsável pelo Novotel Morumbi”.
Dentro da Accor, Luppi revezou entre as vendas e o operacional. “Minha vida acontece em ciclos de 2 anos. Fui vendedor (92 a 94), Gerente Regional de Vendas e Gerente de Vendas”. Luppi trabalhou com os produtos Novotel, Pathernon e Ibis. “Me apaixonei por vendas. Vendia o serviço, que é muito difícil. Você entra só com as fotos, não é como vender um óculos”. Na empresa, passou por formação na Academia de Serviço Accor, na França.
Em 1996, Luppi recebeu o convite do Eldorado para ser Gerente de Vendas de seis hotéis. Ele ficou no cargo por um ano e voltou à Accor como Gerente Geral do Pathernon QI. Esse empreendimento, localizado em Moema, era o de maior rendimento da rede no Brasil. “Foi a minha primeira gerência geral, tive que aprender na raça. Foi uma experiência maravilhosa ver a transformação de um flat em um hotel”, diz.
Agora, foi a vez do mercado hoteleiro sofrer um grande impacto. O mercado vivia a febre dos flats. Luppi saiu do Parthenon QI e no dia 16 de dezembro de 1999, entrou para a rede Sol Meliá, em que ficou até setembro deste ano. Na rede espanhola, foi Gerente de Vendas do Cone Sul por dois anos e voltou à operação com a abertura do Tryp Iguatemi, entre 2001 e 2003. “Durante cinco meses fui também gerente geral Meliá Jardim Europa”, conta Sérgio. Depois retornou às vendas como diretor exclusivo para o Mofarrej e WTC, assumindo posteriormente a diretoria de vendas também do Gran Marquise.
Em 2005, voltou ao Tryp Iguatemi e em 2008, enfrentou um grande desafio. Foi gerente geral do hotel Meliá Angra & Resorts, o primeiro hotel de lazer de sua carreira.
Luppi é casado, tem um filha formada em Rádio e TV, e segue a filosofia de vida da maçonaria. Como lazer, gosta de cinema, literatura e teatro, além das caminhadas.
Confira uma entrevista exclusiva com o profissional sobre o panorama do turismo nestes últimos 40 anos.
Por Ana Lucia Silva e Peter Kutuchian
HN: Você está participando ativamente do setor turístico há 40 anos. O que mudou nas últimas décadas no turismo?
Sérgio Luppi: A aviação perdeu o glamour, mas ganhou facilidade porque agora viajar de avião ficou muito simples.
A profissionalização dentro da área do turismo foi a principal mudança, antes era uma área onde não existia treinamento. O setor de serviço ficou com a mão de obra mais profissionalizada. Se antes as pessoas que administravam os hotéis eram filhos de engenheiros e famílias abastadas, a chegada das grandes redes mudou a situação. Isso também fez com que os hotéis pagassem melhor e que o mercado fosse visto como uma oportunidade para muita gente, principalmente em São Paulo com o aumento do número de hotéis, dos eventos na cidade e no destaque dentro do turismo de negócios. Por outro lado, no início dos anos 2000, o cliente ficou em segundo plano, ficou esquecido que ele é quem ainda paga o salário do hoteleiro.
HN: Dentro ainda do contexto do panorama, como você analisa o setor de vendas?
Luppi: Os profissionais de vendas foram atrás de capacitação e de especialização como pós-graduações e MBAs, principalmente na área de marketing e comunicação.
Antes da internet, o vendedor era mais vendedor. Era preciso vender um sonho, um serviço. Vendíamos a voz da telefonista, o sorriso do recepcionista e a amabilidade do receber, a pura hospitalidade! Na hora da venda, o diferencial era o serviço oferecido além, é claro, da suntuosidade dos hotéis de luxo.
HN: E o quais são os principais pontos que mudaram dentro da hotelaria?
Luppi: Saíram o telefonista e o mordomo, a hotelaria perdeu serviços e ganhou tecnologia. Tudo hoje está englobado, faz parte do crescimento da indústria. Antes haviam muito mais colaboradores trabalhando dentro de um hotel.
Com as crises e com o boom do mercado no início da década, os hoteleiros se viram em uma situação em que precisavam cortar os custos. Infelizmente, os maiores cortes foram na mão de obra, o que fez com que grande parte do trabalho feito por três pessoas, fosse feito por uma só. Um exemplo é a telefonista, o order taker do room service, funções que foram parar nas costas dos recepcionistas.
Alguns hotéis continuam com o glamour, é verdade, mas são poucos, aqui no Brasil, podemos contá-los em duas mãos.

HN:
A primeira década do século está acabando e muita coisa aconteceu. Como você vê o cenário atual da hotelaria?
Luppi: É bonito e está bem melhor que os anos 2000. A movimentação é boa e a tendência é crescer, mas é bom que os hoteleiros fiquem espertos com estes grandes eventos para que não haja um excesso de oferta. Hoje, eu tenho visto muitos hotéis se transformando em prédios residenciais e a cidade perdeu um pouco da referência que os empreendimentos tinham no passado.
HN: Como você vê o mercado das feiras produzidas no Brasil?
Luppi: Conheci diversos tipos de feiras pelo mundo como a Fitur (Espanha) a de outros setores também como a de Hanover (Alemanha). O papel das feiras no Brasil tem caído um pouco, a internet já deixa o agente de viagens atualizado. Os eventos podem ser melhor usados, ainda há recursos a serem explorados, como as rodadas de negócios, que são muito úteis. É necessário que as feiras não sejam feitas só pelo oba-oba,  que elas permitam dar condições especiais para ter um sentido estar lá.
Os organizadores podem incentivar os expositores para estarem na feira com condições de venda inexistentes em outra oportunidade, assim criam chamarizes para atrair o público. A forma que estão sendo feitas está ultrapassada e é preciso reinventar a roda.
HN: Quais são os profissionais do turismo que você admira?
Luppi: A lista é bem grande. Vamos lá: Rui Manoel de Oliveira (Sol Meliá), Roland de Bonadona (Accor), Jorge Alves (Bristol), Jayme Cannet (Deville), Eduardo Sardinha (Glória Palace), Lúcio Suriani (Estanplaza), Margarida Yassuda (Hotéis Luzeiros), Ricardo Aly (Bourbon) e Marcos Aurélio Carvalho (Paulista Plaza).
Tem uma geração nova muito boa também como Gustavo Syllos, Fernando Gagliardi, Gustavo Santana, Sérgio Almeida e Jeferson Munhoz. Acho muito bom quando as empresas misturam profissionais jovens e mais velhos. Tenho muitos amigos jovens graças a este convívio.
HN: Como é trabalhar com os segmentos de business e lazer? Nos últimos anos, você foi gerente geral do Melía Angra, no litoral do Rio de Janeiro, e morou no resort, como foi?
Luppi: Sou mais hotel dos homens de gravata, que você vê no café da manhã e no coffee break. Mas foi muito válida a experiência com o lazer, em que você vê o cliente a todo o momento. Em Angra, eu era gerente geral 24 horas e resolvia problemas às 2h da manhã.
A expectativa dos clientes de lazer é diferente dos de negócios. Se o tempo fica instável e chove, os hóspedes reclamam e perdem o humor. Temos que ter tudo pronto para enfrentar quaisquer mudanças repentinas.
HN: Como você vê o destino Angra dos Reis?
Luppi: Angra foi muito castigada este ano com as chuvas. Lá chove muito e atrapalha a chegada dos turistas. A cidade precisaria de um aeroporto, de melhora nas vias terrestres, além da melhoria na divulgação do destino, que tem muito potencial. Eu acredito que Angra ainda vai pegar, com suas ilhas e atividades marítimas, principalmente no mercado sul-americano, como Chile, Uruguai e Argentina. As operadoras querem grandes hotéis (para voos fechados) e o sistema de all inclusive e Angra tem tudo isso para oferecer.


HN:
Se você fosse o dono de um hotel como seria?
Luppi: Seria numa grande capital, talvez Curitiba, um hotel de negócios com um esquema de franquias. Assim, seria de uma bandeira, mas eu poderia fazer minhas ideias aparecerem. Acho que o Brasil tem poucas franquias e que deveria haver mais investimento nesse segmento, como nos Estados Unidos, com investidores mais capacitados e proprietários com conhecimento do ramo.
HN: Qual seria sugestão para novos investidores?
Luppi: Falaria para investir na capacitação e primeiro conhecer o que é a hotelaria, sendo usuário e estando em contato com empresas da área. Depois aconselharia um MBA e também a contratação de uma consultoria especializada. É muito importante também o estudo da viabilidade local e usar o asset management durante a operação para servir como base.
HN: Quais são as dicas que você dá para os profissionais de vendas?
Luppi: Mesmo com a internet, não se pode deixar de conhecer o cliente, seja ele intermediário ou final. É preciso estar em frente ao agente ou à secretária. O contato direto interfere na decisão e ser simpático é fundamental.
A gente está diretor ou está vendedor e o nosso sobrenome é o da nossa empresa. Por isso devemos sempre trabalhar para nós também, pois tudo vai para o currículo. Mas, não basta colocar no papel, que aceita tudo, um bom nome no mercado abre muitas portas.
HN: Quais são seus planos para o futuro?
Luppi: Não pretendo parar de trabalhar, quero estar com a minha família e escrever um livro de memórias.