Clique no vídeo acima e assista à animação gráfica. Parece um futuro distante, certo? Não, você está redondamente enganado. Estudo da consultoria EY estima que veículos autônomos serão 4% da frota mundial em 2025, percentual que subirá a 75% em 2035. Em cima dessa previsão, o designer americano Steve Lee desenvolveu um conceito inteiramente inovador para a indústria hoteleira. Ao unir transporte e hospitalidade, tudo em carros autopilotados, Lee abriu as portas para a era da Transpitality (Transpitalidade).

Apesar de conceitual, o projeto tem perspectivas concretas de virar realidade. Os investimentos em carros autônomos são pesados mundo afora, tanto de montadoras, quanto de empresas como Uber e Google. No final de 2018, por exemplo, a Audi anunciou que vai investir € 14 bilhões até 2023 em mobilidade elétrica, digitalização e direção autônoma. No total, o aporte previsto pela marca de luxo da Volkswagen para os cinco anos chega a € 40 bilhões.

“Há muitos projetos conceituais de carros autônomos hoje em dia, mas a maioria ligada ao design e à tecnologia dos veículos”, afirma Lee, em entrevista exclusiva ao Hotelier News. “A partir dessa premissa, tentei dar uma perspectiva diferente, explorando o conceito de ‘mobile room’ (quarto móvel, na tradução livre)”, acrescenta o jovem americano, nascido em Iowa City e criado em Detroit, onde seu pai trabalhava como projetista de carros na Hyundai. “Surgiu ali o Autonomous Travel Suite”, acrescenta.

Segundo Lee, com o desenvolvimento acelerado da indústria de carros autônomos (e elétricos), a autonomia desses veículos cresce a cada dia. Hoje, por exemplo, um automóvel com uma bateria de 30kWh roda, em média, 160 quilômetros (km). Modelos da Tesla Motors, contudo, vão além. O Tesla Model X pode percorrer 400 km por carga, enquanto o Tesla Model S 100D alcança até 1 mil km com apenas uma recarga.

Transpitality - Steve LeeLee é filho de um projetista de carro da Hyundai, com mestrado por Yale

“Isso permite viagens de 10 horas, por exemplo. O que me levou a pensar nesse projeto conceito não foi a autonomia desses veículos, mas quanto tempo uma pessoa consegue ficar lá dentro. Comecei, então, a projetar cenários: 30 minutos, uma hora, duas horas e 10 horas”, diz Lee, fundador do escritório Aprilli Design Studio, baseado em Toronto, no Canadá. “Obviamente, percursos mais longos demandam cama e chuveiro, por exemplo. Ou seja, a viagem deixa de ser apenas um serviço de transporte, torna-se de hospedagem também. Foi daí que criei o conceito transpitality”, explica.

Transpitality: mapas

De acordo com Lee, a partir de 2021, o mercado automobilístico deverá ser inundado por lançamentos de carros autônomos. “Muitas montadoras têm apresentados planos e projetos conceitos. É inevitável”, afirma o designer, que aponta um gargalo para a proliferação mais rápida desses veículos.

“Uma questão-chave atualmente são os mapas das cidades, e empresas como Google vêm trabalhando forte no desenvolvimento disso. Sem eles, dados de topografia e das condições do tráfego, o crescimento do mercado vai demorar”, aponta Lee. “Algumas localidades estão na frente dessa corrida, como Toronto, Los Angeles e San Francisco. Já se pode falar em rotas na Costa Oeste dos Estados Unidos (veja imagem). Uma vez que isso se consolidar, a indústria do transpitality vai expandir rápido”, aposta.

Transpitality - mapa de desenvolvimento EUAEm 2035, praças importantes da Costa Oeste já deverão estar conectadas

Na avaliação do americano, a janela de oportunidade para o seu projeto conceito vai de 2025 a 2035. Até lá, ele conta, continuará trabalhando duro no seu desenvolvimento. “Estamos trabalhando no modelo de sistema autônomo e, hoje, diria que ela seria muito caro. O mercado, contudo, vai barateá-lo”, avalia Lee. “Tenho feito reuniões com montadoras e empresas hoteleiras e do mercado imobiliário para apresentar nosso projeto conceito. Ter vencido o Radical Innovation Award 2018 vem abrindo muitas portas”, acrescenta o designer, referindo-se à premiação criada pelo John Hardy Group, uma das desenvolvedoras de projetos hoteleiros mais conhecidas nos Estados Unidos.

Dessa forma, a cena idealizada por Lee no vídeo que abre essa matéria tem tudo para virar realidade. O hóspede pega o smartphone, chama o Autonomous Travel Suite de uma rede hoteleira, traça a rota e, em poucos minutos, o veículo autônomo está na porta de casa. Ele entra no veículo, acomoda-se e pode dormir, ler e trabalhar dentro da cabine, tudo com internet de alta velocidade. Chegando ao destino, o carro se direciona ao edifício-garagem do hotel, onde o passageiro se transforma efetivamente em hóspede, tendo à disposição tudo que um empreendimento hoteleiro pode oferecer.

E o Brasil?

Esse mundo fantástico e inovador desenvolvido por Lee poderia virar realidade no Brasil? Especialistas dizem que a falta de infraestrutura, questões de regulamentação e altos custos afastam possíveis investidores de projetos nessas tecnologias no país.

A boa notícia – e isso efetivamente é um passo importante – é a expansão crescimento da rede 4G. Vital para a evolução da conectividade dos carros, ela vai sair de apenas 10% das conexões, em 2016, para 57% no ano que vem.

Ainda assim, o melhor uso das funcionalidades de carros conectados só será obtido a partir da implementação do 5G. Capaz de processar dados móveis até 20 vezes mais rápidos que o 4G, a tecnologia não deve sair tão cedo do papel.

No final do mês passado, Leonardo Euler de Morais, presidente da Anatel, informou que o leilão de faixas de frequência compatíveis com a rede de quinta geração ocorrerá em março de 2020. Vale destacar que a realização do pleito não garante a disponibilidade da tecnologia de imediato.

A expectativa no mercado de telefonia é que isso ocorra, no mínimo, em 2025, atraso estimado de cinco anos em relação aos países desenvolvidos. Então, enquanto Steve Lee já poderá pensar em solicitar seu Autonomous Travel Suite para se deslocar confortavelmente entre Los Angeles e San Francisco, você ainda terá que dirigir (e se estressar) em meio ao sufocante trânsito na Via Dutra.

(*) Crédito das fotos: Divulgação/Aprilli Design Studio

(**) Crédito do vídeo: Divulgação/Aprilli Design Studio