quinta-feira, 14/novembro
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Ana Beatriz Ponte Barbosa: De quem é o problema?

Cláusulas de indenidade são aquelas que uma parte assume responsabilidade por proteger a outra de passivos. Isto porque cada uma das partes quer evitar ser responsabilizada pelos problemas que cabem à outra. Simples assim.

Ocorre que a negociação de cláusulas de indenidade é assunto que rende inúmeras horas de discussão. E, apesar disso, quando o passivo surge, nem sempre a regulação “copia e cola de modelo” funciona. Alguns pequenos cuidados podem evitar que as cláusulas não saiam pela culatra.

Pois bem, tais cláusulas, quase sempre presentes nos contratos hoteleiros, costumam resguardar a bandeira de passivos relacionados à operação, em especial com relação a questões ambientais, tributárias, trabalhistas e consumeristas.


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Por outro lado, a bandeira costuma resguardar e proteger os proprietários do hotel de litígios que possam advir de questões relacionadas à propriedade industrial ou intelectual, exigindo dos proprietários colaboração e garantias de que não irão registrar, requerer registro ou de qualquer apropriar-se dos ativos intangíveis da Operadora. Atos dolosos e eventualmente os qualificados como “gross negligence” também, por vezes, são objeto de cláusulas de indenidade.

No mérito da negociação vê-se, em alguns casos, certa disputa com relação a responsabilização entre o proprietário e a Operadora.

Isto porque os proprietários, ao contratar a operadora, entendem que estão contratando um profissional que se responsabilizará em caso de falta de lucro ou resultado da operação. O conceito de que os proprietários assumirão o risco de mudanças legislativas, inadimplemento contratual ou danos decorrentes de atos ou omissões da operação (inclusive se ocorrerem por negligência da operadora), por vezes é difícil de ser compreendido.

Entretanto, a praxe do mercado de bandeiras internacionais é que efetivamente a Operadora somente responde em casos limitados visto que – nos casos de administração, por exemplo – atua como mera mandatária dos proprietários. O mesmo se dá em caso de franquia ou licenciamento de marcas nos quais a Bandeira não atua na operação.
Nada obstante, superadas as questões de conceito e mérito, há algumas disposições que vale a pena se atentar.

Uma delas é a obrigação de excluir a parte que não seja responsável da lide. É comum que se preveja que, caso a parte não responsável venha a ser acionada, a parte cujo passivo lhe compete deve requerer e concordar com a exclusão da lide.

Ora, isso seria ótimo se só dependesse das vontades das partes, o que não é o caso.

Nas ações trabalhistas, por exemplo, é costumeiro se manter a maior quantidade de pessoas na ação até que reclamante seja pago. Em outros casos, o entre tributário, por exemplo, pode entender que há responsabilidade mútua.

Assim, é sempre bom dispor o que ocorrerá no caso de não ser possível a exclusão da lide. Seja por contratação de advogado, reembolso ou de outra forma. Quanto mais clara a cláusula, menos chance de problema.

Outro ponto é a contratação de advogados e custas. Quem poderá escolher? Serão defesas coordenadas? Há limite de valores? Quem vai adiantar custas? Todos estes detalhes podem ser pré-definidos.

Por fim, o direito genérico de reter pagamentos enquanto não houver a exclusão da lide ou enquanto perdurar o passivo. Esta cláusula muitas vezes “passa” despercebida em contratos. Ora, para quem precisa receber isso é absurdo visto que, como mencionamos acima, nem sempre está sob o controle da parte responsável.

É importante, então, que se defina que a retenção seja proporcional ao passivo envolvido ou qualquer outro limite aplicável ao caso. Assim, as partes estarão mais protegidas nos seus interesses.

Estes são alguns pontos a se atentar e buscar regular na negociação e, por mais que possa atrasar um pouco o processo inicial, certamente gerará uma melhor relação continuada no futuro.

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Ana Beatriz é sócia do Perez & Barros, Masters of Laws pela New York University, presidente da Comissão de Hotelaria e Multipropriedade do IBRADIM e membro da Comissão de Direito Urbanístico e Imobiliário da OAB/RJ. Professora da CEPED/UERJ e Curso de Pós-graduação da PUC/RJ e ABADI.