sábado, 21/setembro
InícioNEGÓCIOSHSMAI InsightsQual a real situação das OTAs no pós-pandemia?

Qual a real situação das OTAs no pós-pandemia?

Durante os últimos anos, permeados pela pandemia, muito se debateu sobre as mudanças de comportamento do consumidor. Dentre as principais transformações, o aumento das vendas diretas foi um dos temas mais discutidos pelo setor. Consequentemente, muito se falou sobre a perda de share das OTAs no período de crise, mas há divergências quanto a veracidade dessa afirmação.

De acordo com o Phocuswright, 50% das reservas online dos EUA em 2021 vieram de OTAs, contra 49% em 2019. Na Europa, a relevância das intermediárias é ainda maior, devido à menor participação de mercado das marcas de propriedades.

Os números colocam à prova a diminuição das OTAs no sistema de distribuição hoteleiro. Para Max Starkov, professor adjunto do NYU Tisch Center para Hospitalidade e Consultor de Tecnologia e Digital para Hotelaria, a noção de que as agências online estão perdendo participação de mercado é uma mera ilusão.


LEIA TAMBÉM


Em mais um conteúdo da HSMAI Insights, o profissional listou três razões pelas quais as OTAs devem manter suas fatias robustas no share do setor hoteleiro:

1- As OTAs acumularam robustos programas de fidelidade

Booking e Expedia usaram a pandemia para reformular seus programas de fidelidade, investindo fortemente em tecnologia, talentos e esforços de vendas. O Expedia consolidou seus três programas de fidelidade (Expedia, Hotels.com, Orbitz) em um único programa, e agora possui mais de 155 milhões de membros.

O programa de fidelidade Genius, da Booking.com, tem um número de membros semelhante. Descontos para membros estão disponíveis em mais de 390.000 propriedades participantes em todo o mundo. Os membros Genius Nível 1 desfrutam de redução de até 10%, Nível 2 – até 15% e Nível 3 – até 20%.

“Quem oferece esses descontos? Os hoteleiros, claro, todos os 390.000 deles. Descontos que se somam à comissão  que pagam ao Booking.com. Por que tudo isso é importante? Um programa de fidelidade ou de apreciação de hóspedes significa repetir negócios! Mais importante, você vê algum desses mais de 300 milhões de membros dos programas de fidelidade das OTAs reservando diretamente com um hotel? Eu não”, avalia Starkov.

“Quantos hotéis independentes têm uma tecnologia de CRM e algum programa de fidelidade ou reconhecimento de hóspedes? Menos que 10%. Isso explica por que, em qualquer noite, apenas 10% a 15% das diárias em quartos independentes são de hóspedes recorrentes”, acrescenta o professor.

Os hóspedes recorrentes já conhecem a localização da propriedade, o produto do hotel e a proposta de valor, e são de cinco a 15 vezes mais baratos de adquirir. Segundo Starkov, apenas um app de tecnologia significativo pode garantir um engajamento relevante com a base de clientes.

A tecnologia de CRM não apenas fornece comunicações automatizadas pré, durante e pós-estada, pesquisas de satisfação de hóspedes, automação de marketing de retenção de hóspedes e campanhas, mas dá um passo adiante por meio do gerenciamento de programas de reconhecimento de clientes e marketing de fidelidade. Todas essas iniciativas automatizadas mantêm “a conversa em andamento” com os futuros e antigos hóspedes, mantendo-os engajados e orientando-os na direção certa: reservar seu hotel quando for a hora de visitarem seu destino novamente.

“Na minha opinião, desenvolvedores, proprietários e gerentes pós-crise irão em massa para as grandes redes, atraídos por seus bolsos profundos, capacidade de implementar protocolos de segurança e limpeza, grandes programas de fidelidade capazes de gerar 58%-62% das diárias, domínio nos mercados de viagens corporativas e de grupo, ‘pilha’ de tecnologia abrangente, experiência em manter e aumentar a ocupação e RevPars no pós-crise, distribuição direta de canal inigualável, comissões OTA duas vezes menores e dependência até quatro vezes menor das OTAs”, pontua Starkov.

2- As OTAs nunca deixaram de investir em marketing

Em 2021, um ano de pandemia completo, o Expedia gastou quase 45,8% da receita líquida em marketing, resultando em gastos de US$ 3,9 bilhões em presença de marketing. O Booking Group informou que desembolsou US$ 3,8 bilhões no departamento no ano passado, com receita de US$ 11 bilhões, ou seja, 35%.

E os hoteleiros? Em anos “normais” como 2019, os hotéis gastam em marketing menos de 2,5% da receita líquida dos quartos. A STR/CoStar divulgou recentemente alguns dados preocupantes, mostrando claramente que as despesas com marketing na hospitalidade dos EUA durante a pandemia encolheram significativamente em comparação com 2019, caindo para 50% em 2020 e se recuperando ligeiramente para 54% em 2021 do nível pré-pandemia. Ou seja, os hoteleiros gastaram em marketing 1,35% da receita líquida de quartos (54% de 2,5%).

A situação é semelhante quando falamos de investimentos em tecnologia. Os dados da STR/CoStar mostram claramente que os gastos com TI na hospitalidade dos EUA diminuíram significativamente durante a pandemia para um nível médio de 50%, em comparação com antes da crise.

Os gastos com marketing e tecnologia dos hoteleiros na Europa e na Ásia-Pacífico são ainda piores do que na América do Norte. Já a relação de distribuição online OTA versus venda direta em hotéis independentes é negativa. Além disso, os independentes pagam comissões OTA duas a três vezes mais altas, além dos descontos para membros de fidelidade.

“Os independentes já estão ficando para trás na adoção das melhores práticas em gerenciamento de receita, CRM, marketing digital, de marca e aplicativos de tecnologia, cruciais para atender os consumidores de viagens com experiência em tecnologia”, alega Starkov. “Com todas as repercussões persistentes da pandemia na hotelaria, não espero que os hoteleiros, de repente, dobrem seus gastos com marketing e tecnologia em 2022”, complementa.

3- As OTAs estão se beneficiando da transformação digital acelerada

A pandemia acelerou a transformação digital em 10 anos, de acordo com a McKinsey & Company, enquanto os consumidores de viagens de hoje tornaram-se mais experientes digitalmente do que nunca. Por conta das restrições em todo o mundo, a grande maioria da população foi forçada a usar serviços online para se comunicar, trabalhar, estudar remotamente, pesquisar notícias ou informações, comprar bens e serviços, solicitar comida, assistir a serviços de streaming e se divertir.

“Essa “educação e compra online” criou milhões de convertidos e crentes no planejamento e reserva de viagens on-line, o que beneficiará imensamente as OTAs, já que estão investindo bilhões em marketing para alcançar e envolver esses novos públicos”, prevê o professor.

E os hoteleiros podem tirar proveito dessa nova safra de convertidos digitais. Infelizmente, a indústria está muito despreparada para essa nova realidade. Grande parte dos hotéis ainda estão atrasados no que diz respeito ao marketing digital e à tecnologia: conhecimento, investimentos e talento. “Existe hoje uma enorme lacuna entre a preparação digital e tecnológica do setor hoteleiro e as expectativas do cliente, devido ao subinvestimento sistêmico em tecnologia e digitalização”, pontua Starkov.

De acordo com o especialista, muitos proprietários e gerentes de hospitalidade carecem de educação ou conhecimento de tecnologia e marketing digital, e até mesmo de motivação e vontade de aprender sobre as últimas inovações, tendências e melhores práticas.

“A menos que os hoteleiros, de alguma forma, superem seu subinvestimento sistêmico em tecnologia e marketing, temo que as OTAs continuem ganhando participação de mercado na era pós-pandemia. Ao contrário do pensamento de alguns, acredito que as OTAs emergirão mais fortes após dois anos de pandemia, semelhante a todas as crises e calamidades anteriores: 11 de setembro, SARS, MERS, recessão, ZIKA, H1N1 , etc”, conclui o professor.

(*) Crédito da foto: iStock