sábado, 21/setembro
InícioPESSOASArtigosAna Beatriz Ponte: Território: Negociando sua Operação Hoteleira – Parte 3

Ana Beatriz Ponte: Território: Negociando sua Operação Hoteleira – Parte 3

A negociação de qualquer empreendimento imobiliário começa sempre com onde será.

No caso de um hotel, a resposta sobre o ponto é normalmente anterior às negociações com a bandeira. O empreendedor já decidiu onde desenvolver o projeto e costuma já ter o imóvel ou até o hotel em operação buscando alternativas de conversão.

Contudo, quando se iniciam as tratativas com a operadora hoteleira, a questão de território nem sempre é fácil. Isso porque não é só uma questão de escolher uma bandeira que não tenha uma concorrência direta próxima, mas estabelecer restrições para que ela não venha a fazer em determinado raio e por quanto tempo.


LEIA TAMBÉM


Ora, o proprietário comumente não quer que a administradora/locadora de seu hotel venha a operar um empreendimento muito próximo sob a mesma bandeira, haja vista a possibilidade de resultar em alocar reservas para outro hotel que sem a concorrência poderiam vir para o seu empreendimento. Isso porque, na visão do proprietário, a existência de novos hotéis da mesma bandeira poderá diluir a reserva de mercado do seu hotel ao invés de capitalizar com a presença da bandeira na região.

Assim, é bastante comum que nas negociações da carta de intenções – onde os principais termos comerciais são consolidados antes de iniciar as tratativas dos contratos em detalhe – se estabeleçam territórios de exclusividade ou de preferência para o desenvolvimento de novos projetos. Tais cláusulas visam limitar outros hotéis que possam concorrer com o negócio em questão.

Por outro lado, restrições territoriais podem limitar a operadora em relação a novos negócios e, possivelmente, receitas de outros hotéis no território. A bandeira tem interesse em negociar um prazo de contrato longo para permitir o tempo de maturação suficiente e segurança de operação do negócio, mas também em não limitar a possibilidade de novos negócios por mais tempo do que o necessário para que a operação em questão esteja bem desenvolvida e não vá ser substancialmente afetada por um novo hotel da bandeira.

Uma solução para esse aparente “cabo de guerra” é criar fases de desenvolvimento.

Ou seja, por vezes, negocia-se uma cláusula de raio variável ao longo do tempo. A área restrição poderá ser descrita de forma geográfica (por exemplo, raio de cinco quilômetros do hotel que depois se reduz para dois) ou contemplar um mapa em anexo contendo uma ou mais áreas restritas que vão reduzindo ao longo do tempo.

Outros fatores também podem ser levados em consideração. Por exemplo: o nível de performance/desenvolvimento que o hotel chegue a ter (quanto mais rápido o hotel estiver faturando ou gerando lucros, menos necessidade de se manter restrições à concorrência), o desenvolvimento urbano local, a existência de concorrência direta próxima ou outros fatores comerciais.

Pode ser oferecida, também, preferência para novos empreendimentos, desenvolvidos pelo proprietário ou a operadora hoteleira, em determinado território. Isso é uma opção interessante, pois o empreendedor pode escolher ser seu potencial concorrente ou buscar trazer alguma variação entre os dois hotéis, ainda que tenham que obedecer aos padrões da mesma bandeira. Nesse caso, tais preferências costumam vir a conter algumas condicionantes como o empreendedor encontrar-se adimplente com suas obrigações, não haver pontos em disputa, entre outros.

Ademais, tanto na cláusula de raio quanto na de preferência, é costume criar algumas exceções ou exclusões, como:

  • As partes poderão excluir atividades que não sejam concorrentes, como multipropriedades, flats ou empreendimentos residenciais, licenciamento de restaurantes ou outros empreendimentos de natureza diversa;
  • Se houver mudanças substanciais no número de hotéis em operação no território que o estudo mercadológico tenha que ser refeito;
  • Em caso de fusões ou aquisições pela bandeira; e
  • No caso de virem a negociar uma operação maior contemplando a negociação de diversos hotéis ou a conversão de uma cadeia de hotéis sendo que um dos hotéis venha a estar na cláusula de raio.

Ocorrendo uma das duas últimas hipóteses, pode-se ainda negociar a opção para o proprietário escolher entre a conversão para outra bandeira ou modificar o empreendimento.

Vê-se, então, que o conhecimento do mercado em questão, do nicho hoteleiro e diversas formas de negociação podem ser muito úteis para se chegar a um consenso que seja favorável para ambas as partes.

Nesse sentido, é importante trazer para a negociação variadas opções de modo a viabilizar um acordo que funcione no caso em concreto.

—-

Ana Beatriz é sócia do Perez & Barros, Masters of Laws pela New York University, presidente da Comissão de Hotelaria e Multipropriedade do IBRADIM e membro da Comissão de Direito Urbanístico e Imobiliário da OAB/RJ. Professora da CEPED/UERJ e Curso de Pós-graduação da PUC/RJ e ABADI.