Com o plano de ações de cumprimento de contratos nas mãos da Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor), o Hurb inicia seu processo de retorno de valores aos clientes lesados pela crise na empresa. Contudo, a chamada “devolução voluntária” do dinheiro implica, na prática, prejuízo aos consumidores.
A agência de viagens alega que abriu um canal de devolução — mecanismo que retorna os valores aos compradores de pacotes de viagens vendidos durante a pandemia “sem multa e com correção monetária”. Todavia, o meio escolhido pela empresa faz os clientes perderem dinheiro.
Segundo divulgado pelo jornal O Globo, o Hurb optou pela correção monetária por meio dos juros de poupança. Entretanto, o rendimento da poupança é inferior à inflação e ao CDI — que acompanha a taxa básica de juros da economia e é referência para investimentos sem risco. Ou seja, o consumidor vai receber menos do que pagou pela viagem que não fez.
Em simulações feitas com a calculadora do BC (Banco Central), as diferenças são claras. Um cliente que tenha pago R$ 2 mil por um pacote da Hurb em abril de 2020, no início da pandemia, receberia de volta hoje R$ 2.311,64 pelas regras escolhidas pela plataforma. A correção seria de 15,6%. (Simulação feita entre as datas 01/04/2020 e 22/05/2023 e considerando depósitos feitos com as regras da “nova” poupança, criadas em 2012).
Corrigidos pela inflação oficial calculada pelo IBGE (índice IPCA), aqueles R$ 2 mil valem hoje R$ 2.486,67, uma inflação de 24,3%. Considerando-se uma correção até o mês passado, já que o IBGE ainda não divulgou a inflação para maio. Pelo CDI, que vai até o dia 22 de maio, o valor seria ainda maior: R$ 2.505,82.
Desta forma, o Hurb oferece uma perda de, pelo menos, 7% no retorno do cliente de acordo com a simulação. A discrepância se repete em outros intervalos simulados, já que, pela própria regra da poupança, ela sempre renderá menos que o CDI.
O que disse o Hurb
À Senacon, o Hurb alega que o objetivo da “devolução voluntária” é “coibir a recompra de pacote por terceiros de má-fé”. Mas em linhas gerais, a opção adotada pela empresa também é uma saída mais barata do que concretizar as viagens dos clientes.
No ápice da pandemia, a agência vendeu milhares de pacotes com datas “flexíveis” a preços muitos inferiores aos praticados pelo mercado quando os turistas fossem, de fato, viajar. Ao devolver o dinheiro com a correção inferior ao CDI, o Hurb terá usufruído de um funding mais barato do que qualquer outro do mercado — impondo assim um prejuízo financeiro aos consumidores.
Questionada pela reportagem do O Globo, a empresa não explicou o motivo da escolha pela poupança como corretor de valores. Em nota, a agência afirma que “o programa de Devolução Voluntária foi criado pela empresa como uma alternativa para os viajantes e com o propósito de coibir uma ação que vem acontecendo com frequência: a revenda dos pacotes de viagem do Hurb.”
“No programa Devolução Voluntária, viajantes elegíveis podem cancelar seus pacotes sem precisar pagar multa e, além de receber de volta o valor total investido na compra, o montante será recebido com correção monetária, que vai considerar os juros da poupança. A ação, neste primeiro momento, está disponível apenas para alguns destinos e, para os casos que estiverem dentro das normas, a Devolução Voluntária será tratada no prazo de até 45 dias úteis após tal validação”, acrescenta a empresa.
O Hurb destaca ainda que “conforme demonstrado no Plano de Ação apresentado na última segunda-feira à Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), todos os clientes que adquiriram pacotes com a companhia com prazo para 2023 irão viajar.”
(*) Crédito da foto: lidiasilva/Schutterstock