Alejandro Moreno
Alejandro Moreno, diretor da RCI para o Brasil
(fotos: Filip Calixto)

Quando, há pouco mais de 20 anos, os programas timeshare e férias programadas começaram a ser comercializados no Brasil, as negociações não eram muito populares, tampouco frequentes para o público do País. O sistema, incomum para muitos, permite que o consumidor adquira o direito de usufruto num determinado meio de hospedagem, por um período de tempo. A princípio, a venda destes serviços era feita para turistas sul-americanos, geralmente argentinos – país no qual o sistema se desenvolveu com mais rapidez -, que compravam suas hospedagens em empreendimentos ainda incipientes, instalados em destinos pouco explorados da costa brasileira, principalmente nos Estados do Rio de Janeiro e de Santa Catarina.

À época, empresas internacionais atuantes neste nicho já se aboletavam por aqui vislumbrando a possibilidade de arraigar a filosofia no hábito dos viajantes brasileiros. A missão inglória não alcançou o êxito desejado, e poucas entidades desta natureza permaneceram. O fracasso na tentativa é até hoje atribuído ao momento econômico pelo qual a nação passava. Mas nem todo tormento é eterno, e o início dos anos 2000 alterou este cenário dando novo fôlego ao mercado de tempo compartilhado no Brasil, assim como conta em artigo Alessandro Gueiros, da TimeShare Brasil Consultoria.

Remanescente do período em que o timeshare era apenas mais uma palavra de tradução difícil, a RCI (Resort Condominiums International) – empresa especializada no segmento – permaneceu apostando no mercado tupiniquim e hoje conduz transações num metiê que cresceu 402% entre 2005 e 2010, segundo o próprio grupo, e promete alargar ainda mais o número de negócios e participações.

Para explicar o panorama atual, as fragmentações e as possibilidades do sistema no País, Alejandro Moreno, diretor da RCI Brasil, falou ao Hôtelier News e explicou qual o percurso necessário para o desenvolvimento do setor.

Por Filip Calixto

Alejandro Moreno
Rabiscado, o bloco de papel demonstra as explicações do executivo da RCI

Era um dia típico de calor em São Paulo quando o executivo da RCI recebeu a reportagem para a entrevista contando os minutos. Os compromissos e obrigações eram notados a cada vez que o som do elevador ecoava na sala de reunião, onde ocorreu a conversa. Apesar de não disfarçar a pressa, Moreno, que desenhava num bloco de papel para ilustrar seus raciocínios, foi específico nos assuntos que tratou. Sem titubear, apontou a empresa que representa como responsável por índices invejáveis de crescimento – com mesmo tom seguro que apostou no crescimento do timeshare no Brasil.

"O Brasil é um País que vem se destacando muito pela questão econômica. O turismo de lazer [foco principal das transações de timeshare e propriedades compartilhadas] ainda não se desenvolveu totalmente, mas acredito que ainda tem muito espaço para crescer e gerar negócios", comenta.

Sobre a RCI, o profissional explica que a empresa soma mais de 4,6 mil hotéis associados ao redor do mundo e adianta que, para o fechamento de 2012, a expectativa é de 25% a 30% de aumento na geração de novos negócios. "Estamos crescendo cerca de 35% a 40% ao ano. Minha leitura é que continuemos com esta tendência, talvez não com o mesmo percentual, mas crescendo", acrescenta.

Embora tenha divagado sobre as expectativas do grupo e sobre o mercado hoteleiro nacional, não foi por aí que o mexicano de sotaque marcante começou sua fala. No início, falou sobre a história do regime e sobre como surgiu este conceito em âmbito mundial. "O negócio na realidade surgiu há 40 anos, nos alpes suíços, e de uma maneira muito interessante e básica.

Eram várias famílias, que unidas compraram uma casa nos alpes. Após isto, colocaram seus nomes e possíveis semanas de folga em uma caixinha – realizando alguns sorteios. A partir deste mecanismo conseguiam fazer a divisão de quem ia viajar e em qual momento. Assim começou o conceito da propriedade compartilhada, o timeshare", rememora.

Conceito
Classificado por muitos como um termo complexo, o tempo compartilhado é mais que um método de negócio, é um conceito que envolve uma ferramenta de agendamento de viagens e a criação de uma cultura para elaboração das férias ou de passeios pontuais. Notadamente, há empresas de hospedagem e companhias gestoras do processos prestando suporte – como a RCI.

Normalmente os planos negociados são pacotes de pontos, adquiridos pelo hóspede junto ao hotel e que podem ser gastos de acordo com a preferência do cliente. Altas temporadas e acomodações mais luxuosas exigem mais pontos. O contrário, sublinhe-se, também vale. Contudo, os compradores podem ainda ter a possibilidade de usar suas semanas como crédito em outros empreendimentos – o chamado intercâmbio de férias.

Alejandro Moreno
"O Brasil é um País que vem se destacando muito pela questão econômica"

"Adquirir uma programa de timeshare é comprar o direito de uso de uma propriedade durante um tempo específico", simplifica. O executivo esclarece que ainda há confusão, pois só agora o povo brasileiro está se habituando a projetar seu período de descanso.

"É um tipo de negócio que foi pensado e moldado para que pessoas comecem a estruturar suas viagens", complementa. O diretor da RCI articula que todos os envolvidos no processo fazem parte de um clube que organiza, com seus próprios participantes, os pormenores para a realização das viagens. "A RCI, para existir, precisa que haja um meio de hospedagem. A partir dele é que o negócio começa a ser criado", esclarece.

"Você nunca verá uma campanha ou algum tipo de convite da RCI diretamente com o público final. A negociação primeira é feita pelos próprios empreendimentos associados. Nosso cliente principal é o hotel. Depois o cliente dele passa a ser nosso cliente", acrescenta. Os resorts foram responsáveis pela disseminação dos programas no País, relembra o executivo. Para ele, a entrada de estabelecimentos como Rio Quente Resorts, Beach Park, Enotel, Marina Palace, Casa da Montanha, hotéis da rede Othon e do grupo Pestana atrelaram nomes fortes ao negócio e conferiram credibilidade ao programa.

Semelhanças com outros sistemas
Parte da dificuldade que o público tem em entender o timeshare é oriunda da confusão entre este e outros regimes possíveis para férias. Os três principais sistemas que acabam sendo confundidos são: o próprio tempo compartilhado, o fractional e as propriedades chamadas de condo-resorts. Conforme explica Moreno, as diferenças estão em pontos cruciais.

O timeshare é um programa puramente para lazer e para atender pessoas interessadas em viagens de férias. Já o fractional é o meio termo entre o imobiliário e o lazer, porque nele os proprietários compram uma casa e têm que arcar com o custo de manutenção – tendo como contrapartida o direito a um período de estadia por ano. Os condo-resorts, por sua vez, são negócios essencialmente imobiliários e capazes de serem utilizados como uma segunda residência – além de também gerarem renda aos proprietários.

"Timeshare é a venda do direito de uso de um empreendimento de hospitalidade, você não é proprietário da unidade, e sim um contratante que tem o direito de usufruir por um tempo restrito. Fraccional é uma propriedade escriturada, implica na compra de um fragmento do imóvel. Condo-resort é a compra de uma propriedade que está dentro de um meio de hospedagem, que garante a possibilidade de ter um local para ficar e possibilita a incorporação do aposento ao pool do hotel – gerando renda ao proprietário", esmiúça.

Clientela
Apesar das três possibilidades, a primeira vertente é a responsável pelo crescimento das negociações neste segmento, que tem perfil de cliente já conhecido. "São clientes que entendem a necessidade de ter as férias garantidas. O perfil é o clássico casal com mais de 35 anos", define o executivo.

Alejandro Moreno
Timeshare chegou no Brasil há cerca de 20 anos

O tipo de venda para brasileiros também é padrão. Uma semana por ano em contratos que têm validade de 10 anos. Todavia, o crescimento que a empresa notou nos últimos anos foge ao padrão. "Em 2012, devemos fechar 25 mil famílias comprando timeshare no Brasil, há cinco anos eram 1,5 mil famílias", relata, orgulhoso.

Bom para quem?
Defensor da tese de que o timeshare beneficia todos os envolvidos, o diretor da RCI assegura que o programa pode salvar a taxa ocupacional e a rentabilidade de diversos empreendimentos. "O programa de pontos vendido neste sistema incentiva o visitante a frequentar o hotel em períodos de baixa temporada, fomentando a ocupação quando os apartamentos estão mais ociosos e gerando renda para o hotel que estaria desocupado no período", argumenta.

"O empreendimento afiliado à RCI entra numa lista de possíveis destinos para o consumidor final e passa a contar com uma ocupação adicional. A resultante é ter um hotel com 70% de ocupação por ano, como é o caso dos estabelecimentos que vendem timeshare", defende.

Observando o outro lado, ele cita a versatilidade do projeto, alegando que para os clientes o bom é a possibilidade de ter à mão um portfólio com hotéis do mundo todo, conforme o número de pontos disponíveis.

Comercialização
Apesar de promissor, os resorts brasileiros que pensam em aderir ao sistema de vendas de férias planejadas têm algumas arestas a aparar. Para o diretor, a principal lacuna atual é o tipo de estrutura disponível para realizar o atendimento e as transações. "Este não é um produto fácil de comercializar. Isto porque é necessário construir uma estrutura totalmente diferente do que um simples departamento Comercial", cita.

"Um hotel, quando inicia um departamento de Vendas, contrata um gerente para o setor e alguns executivos e os manda para rua para firmar contratos com operadores, com laboratórios e com empresas para fazer eventos. São trabalhos tradicionais de uma divisão de vendas. A comercialização de um produto de compartilhamento de férias é diferente pois implica numa organização maior", pormenoriza.

De acordo com o profissional, é necessário que seja montada uma sala de vendas com um diretor de projeto, um gerente de Marketing, um supervisor de Vendas e um de Telemarketing, normalmente dentro do próprio hotel. Estes colaboradores têm que encontrar meios para trazer o cliente para dentro de sua sala de vendas e, a partir daí, explicar como é o produto e o que ele pode oferecer.

"A parte de Marketing vai fazer todo o necessário para apresentar o produto ao cliente. Geralmente, para começar a comercializar o serviço, o hotel concede facilidades em pagamentos e contratos que dão ao cliente o direito de uso de um período. Após integrado ao programa, o hóspede passa a ter o suporte de pós-venda, feito pelo hotel e pela RCI", finaliza, ainda com pressa e já em tom de despedida, o mexicano.

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