Pedro Cypriano é sócio-diretor da HotelInvest

Quando não está curtindo suas férias em destinos afastados e de forte apelo natural e cultural, Pedro Cypriano gosta de se debruçar sobre números. Como sócio-diretor da HotelInvest, o executivo é um dos responsáveis pelos inúmeros estudos produzidos pela consultoria, além é claro de assessorar grupos nacionais e internacionais na estruturação e avaliação de hotéis. E, veja bem, não é pouca coisa: hoje, na carteira da HotelInvest, há R$ 2,5 bilhões em investimentos hoteleiros.

Cypriano liderou mais de 400 projetos em consultorias globais ao longo dos últimos 15 anos, incluindo países na América Latina, na Europa, na Ásia e na África. Ou seja, desde os seus 20 anos esse paulistano que curte MPB e de se arriscar na cozinha já respirava os números da hotelaria e do mercado imobiliário. Não à toa, escreveu o livro Desenvolvimento Hoteleiro no Brasil: panorama de mercado e perspectivas, publicado pela editora Senac. E, não à toa novamente, é o convidado do Hotelier News de hoje (15) na editoria Três perguntas para.

Três perguntas para: Pedro Cypriano

Hotelier News: Como a HotelInvest está vendo a retomada do mercado hoteleiro nacional? Entre os cenários otimista e pessimista, onde vocês estão?

Pedro Cypriano: Primeiro, é importante dizer que falar de projeções agora é algo bastante complexo. É possível, na verdade, cercar-se de informações para ter parâmetros que sejam mais sólidos do que simplesmente uma crença. Neste sentido, temos conduzido diversas análises, além de conversar com gestores da hotelaria e de companhias aéreas, além de OTAs, entre outros players, cruzando tudo isso com dados macroeconômicos do Brasil. Mesmo assim, o cenário ainda é incerto, dificultando uma tomada de decisão. O que temos hoje é um benchmark: a China. Lá, após dois meses com ocupações em um dígito, notou-se uma recuperação mais acelerada a partir do final de março. Hoje, a taxa está na casa de 30% na média do mercado, chegando até a 50% em segmentos econômicos e algumas praças. Mais ainda, é uma expansão calcada em demanda doméstica. Quando se faz analogia com o mercado brasileiro, que é doméstico e econômico em sua essência, é possível projetar que esse perfil de produto pode crescer de forma mais rápida. Evidentemente, é vital que o controle da disseminação coronavírus aconteça num horizonte mais próximo.

Três perguntas para - Pedro Cypriano_internaPaulistano, de 35 anos, Cypriano morou e trahalhou três anos na Espanha

Então, numa visão otimista, teríamos ocupações próximas a um dígito tanto em abril, quanto em maio no Brasil, com junho já apresentando incremento de demanda, mas com taxas de ocupação ainda baixas, na casa de 20%. Dali em diante, poderia crescer de 10 a 15 pontos percentuais nos meses seguintes. Na prática, neste cenário otimista, haveria a chance de chegarmos ao final do ano com ocupações mais próximas de 2019, eventualmente um pouco abaixo, caso o PIB do terceiro e quarto trimestres continuem em queda. Já numa visão mais conservadora, e diante de um cenário de descontrole da doença, a ocupação seguiria em um dígito nos próximos meses, com a expansão prevista para junho e julho no cenário mais otimista se estendendo para 2021, talvez até rompendo o primeiro e segundo trimestres.  Então, esses são os grandes balizadores que trabalhamos atualmente na HotelInvest. Por fim, em relação à tarifa e num cenário otimista, ainda não vemos o preço caindo numa velocidade excessiva. Talvez, a exceção seja o segmento de lazer, que pode receber mais pressão por parte de intermediadores para que baixem as tarifas.

HN: No seu entendimento, o que será crítico nesse período inicial de retomada?
 
PC:
De cara, o ponto principal é gerar volume para permitir que hotéis tenham operação minimamente viável, pagando os custos operacionais. É evidente que a falta de previsibilidade deixa hoje todo mundo preocupado, levando a medidas de corte de custos baseadas no pior cenário possível – e não tem como ser diferente. Fato é que se essas ações não são tomadas agora, num horizonte de médio prazo só restaria acesso fácil a financiamento, possibilidade que não se vê com clareza no mercado hoteleiro. Então, se a retomada sair no cenário otimista citado na pergunta anterior, os hotéis começam a ganhar fôlego para permitir uma gestão mais eficaz. No entanto, tudo é ainda muito incerto. Portanto, é natural os gestores hoteleiros serem tomados pelo medo, sendo capazes de tomar medidas que não indicadas, como promoverem uma possível guerra de preços. Em resumo, dois fatores críticos estão sobre a mesa: imprevisibilidade sobre a retomada da demanda no curto prazo e os desdobramentos que isso pode gerar na precificação em um horizonte de médio prazo. Se, de fato uma guerra tarifária acontecer no mercado, a curva de recuperação do setor provavelmente será mais longa, o que seria o pior cenário possível.

HN: Por último, quando o setor poderá, enfim, falar de desenvolvimento hoteleiro novamente?

PC: Antes, é importante entender o pipeline já existente. Hoje, há no Brasil quase 170 hotéis em desenvolvimento e, destes, pouco mais de 60 estavam previstos para 2020. O primeiro efeito concreto da pandemia é que, muito provavelmente, esses empreendimentos não abrirão neste ano. Já os produtos com inauguração prevista entre 2021 e 2024, alguns deles já estavam em obras. Diante do cenário atual, é natural que, em curto prazo, aconteça uma desaceleração dessas obras, até para preservar o caixa das construtoras e incorporadoras responsáveis pela construção. Para além dos hotéis em desenvolvimento, acredito que tudo vai depender de como será 2021. É importante lembrar que, analisando o desempenho hoteleiro de 2019, não se justificava construir muitos hotéis em várias cidades do país. Plausível era analisar a perspectiva de crescimento do setor para tomar a decisão de lançar um projeto, não a base de desenvolvimento em si. Minha aposta é que novos estudos de hotéis aconteçam, de maneira ainda tímida, em 2021, intensificando-se a partir de 2022. Agora, reiterando o que falei antes, tudo vai depender de como vai se dar a retomada do mercado hoteleiro no pós-pandemia.

(*) Crédito das fotos: Divulgação/HotelInvest