Quando o Voa Brasil foi apresentado, a proposta do governo Lula era incentivar as viagens aéreas com valores de passagens mais competitivos para aposentados e estudantes. Entretanto, um levantamento feito pela Folha de São Paulo, a partir de dados públicos da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), aponta que menos de 15% dos bilhetes vendidos pelas companhias entre janeiro e maio deste ano foram comercializados por até R$ 200 – teto estipulado pelo programa.

A Anac revela que, dos 12,4 milhões de assentos vendidos nos cinco primeiros meses deste ano, somente 13,9% deles se encaixariam na faixa de preço definida pelo Voa Brasil. De acordo com as informações do órgão regulador, mais de 70% dos bilhetes nesse período registraram preço entre R$ 201 e R$ 1.000 e outros 13% das passagens custaram mais de R$ 1.000. Essas faixas estão acima do preço permitido no programa.

Procurado pela reportagem da Folha, o Ministério de Portos e Aeroportos alega que o novo programa mira passagens ociosas para determinados grupos e diferentes períodos do ano. Segundo a pasta, cerca de 20% dos assentos das aeronaves, em média, estão ociosos.

O ministério diz ainda que a tarifa aérea média no país está em queda constante. “Isso se deve a diversos fatores, como a queda de aproximadamente 28% no preço do QAV (querosene de aviação) entre janeiro/22 e junho/24”, escreveu a pasta, em nota.

Aloizio Mercadante, presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), disse, este mês, que para o banco financiar ajuda às aéreas, as empresas terão de comprar aeronaves da Embraer como contrapartida.

Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontam que o valor das passagens aéreas acumula queda de 2,59% nos últimos 12 meses contados até junho. Ainda assim, mais da metade dos bilhetes é comercializada acima dos R$ 400, segundo informações da Anac.

Rotas em destaque

Ainda de acordo com as informações da Anac, São Paulo concentra a maior parte das 10 rotas que mais venderam assentos por até R$ 200. Com 181,6 mil bilhetes comercializados nessa faixa de preço, o trajeto entre o aeroporto de Congonhas, na Zona Sul da capital paulista, e o Santos Dumont, no Rio de Janeiro, ou vice-versa, foi o que mais vendeu passagens nesse perfil.

Um bilhete aéreo para esse trecho por até R$ 200 sairia mais barato do que uma passagem de ônibus em poltrona tipo leito, que costuma ser vendida por empresas rodoviárias por um valor acima desse teto.

Outras rotas que também venderam muitas passagens nessa faixa de preço se concentram no centro-sul do país e conectam, sobretudo, Congonhas a destinos como Brasília, Minas Gerais, Paraná e Goiás (como origem ou destino).

Entre os 10 trechos que mais comercializaram passagens por até R$ 200 nos primeiros cinco meses do ano, somente um trajeto não se concentrou nessa área: o voo entre Belém e Macapá.

Na prática, não há subsídio do governo ou desconto promovidos pelas companhias. A plataforma do Voa Brasil funciona como um agregador de passagens baratas.

O programa Voa Brasil foi lançado em julho deste ano, após vários adiamentos, com uma disponibilidade de 3 milhões de passagens aéreas de até R$ 200 para aposentados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) que não tenham viajado nos últimos 12 meses. O patamar ficou abaixo dos números iniciais que o governo almejava alcançar, entre 4 milhões e 5 milhões de bilhetes.

Segundo o Ministério de Portos e Aeroportos, 23 milhões de aposentados do INSS estão aptos a adquirir passagens nesta primeira fase do programa. O valor do bilhete não inclui a taxa de embarque. As passagens dão direito a uma bagagem de mão (de até 10 kg) e uma bolsa ou mochila pequena.

O governo federal pretende expandir o programa, posteriormente, para estudantes do Prouni (Programa Universidade para Todos). A expectativa é contemplar cerca de 700 mil alunos.

O que dizem as companhias aéreas

Em nota à reportagem da Folha, a Gol disse que está ofertando voos de até R$ 200 no portal do Voa Brasil. A companhia afirma que as rotas atendidas serão apenas as domésticas em voos diretos, de acordo com a sazonalidade e a disponibilidade de assentos de cada trecho.

A Latam afirma que a disponibilização de passagens para o programa é dinâmica e considera diversos fatores como sazonalidade, demanda, origem e destino do voo.

A Azul disse que segue posicionamento da Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas), no qual a entidade afirma reconhecer o esforço do governo federal para democratizar o acesso ao transporte aéreo por meio do Voa Brasil.

(*) Crédito da foto: Eduardo Anizelli/Folhapress