Olhe para a sua lata de lixo agora. Seja honesto, é impossível não sentir culpa, certo? Sim, o desperdício de alimentos é uma questão global que nunca foi endereçada da forma correta. O estudo The Food Waste Index Report 2021 (acesse aqui), produzido pela Unep (United Nations Environment Programme), estima que 931 milhões de toneladas de comida foram desperdiçadas em 2019, o equivalente a 17% do total disponíveis para os consumidores. É muito coisa sendo jogada fora, certo?

Há o que fazer? Bem, já se tentou quase de tudo e, sim, há iniciativas muito bacanas aqui e ali, o que inclui a hotelaria. A Accor, por exemplo, utiliza desde o ano passado IA (inteligência artificial) em conjunto com uma unidade de medição para mitigar os efeitos do desperdício em todo o portfólio de hotéis. Em paralelo, a rede francesa tem uma parceria com a Food to Save, startup que engaja estabelecimentos a reduzirem seu descarte de refeições, assim como a Atlantica Hospitality International.

Há centenas ou mais de exemplos em toda nossa indústria, mas o fato é que existem outras dezenas de estudos que mostram que essa conta ainda não fechou. Na verdade, ainda está muito longe de chegarmos a um ponto de inflexão. O desperdício continua elevadíssimo, a insegurança alimentar persiste e o impacto no meio ambiente só aumenta. Então, vale questionar novamente: há o que fazer?

Um novo approach, digamos assim, tem aparecido no meio acadêmico. A ideia é entender os mecanismos psíquicos que nos fazem seguir esse caminho. Relativamente nova, a área da psicologia do desperdício ganha espaço e um estudo recente trouxe boas reflexões sobre o tema. O ponto de partida é bastante lógico: as pessoas não fazem ideia de quanto jogam fora de alimentos, o que significa dizer que é realmente complicado encarar um desafio que desconhecemos.

Três pesquisadores da Universidade Anglia Ruskin (Reino Unido) avaliaram o impacto do pensamento consciente na transformação dos hábitos alimentares quando o foco é a redução do desperdício. Publicado na revista Nature, principal referência global em publicações científicas, a pesquisa Cerebrating and engagement, paths to reduce fresh produce waste within homes (acesse aqui) acompanhou acompanhou 154 famílias britânicas por seis meses para medir as perdas de frutas, legumes e verduras, que globalmente (e historicamente) são as categorias mais desperdiçadas no âmbito doméstico.

Como funcionava e conclusões

As 154 famílias foram divididas em dois grupos. Metade foi convidada a registrar quais produtos compravam e, em paralelo, deveriam anotar até quando deveriam ser consumidos de acordo com seus prazos de validade. Anotações nas portas das geladeiras serviam como lembretes diários do que deveria ser ingeridos primeiro, assim como SMSs as lembravam de olhar os registros antes de preparar as refeições.

Já a outra metade das famílias foi instruída a medir o desperdício semanalmente, mas sem qualquer tipo de alertas. Ao final dos seis meses da pesquisa, os dois grupos acabaram jogando menos comida fora do que antes, com ligeira vantagem para o primeiro grupo.

“Pensar no desperdício de alimentos por seis semanas é um pequeno preço a pagar, se o resultado for uma diferença significativa e de longo prazo para o bem-estar do nosso planeta.” – Cathrine Jansson-Boyd, da Universidade Anglia Ruskin

A conclusão maios relevante, contudo, não tem nada a ver com o menor desperdício. A descoberta mais valiosa, na avaliação dos pesquisadores da Universidade Anglia Ruskin, foi descobrir quanto tempo é necessário para consolidar mudanças de comportamento. E, segundo eles, é preciso apenas seis semanas. Isso porque, mesmo depois do período de controle, as 154 famílias mantiveram os hábitos adquiridos.

Concordam? E aí, vamos nessa?

(*) Crédito da capa: Pete Linforth/Pixabay