ocupação - lazer duante a semanaGuijarro: quem está melhor agora fez um trabalho bem feito em cima de clientes fidelizados

Nos últimos meses, o setor de turismo e, em especial a hotelaria, viraram de cabeça para baixo devido à pandemia. Com restrições de viagens, malhas aéreas paralisadas e redução significativa do rodoviário em prol do distanciamento social, muitas preocupações, dúvidas e expectativas surgiram. Após um período de mais de 90 dias de nervos à flor da pele, o mercado começa a dar seus primeiros sinais vitais impulsionados pelo segmento de lazer. Entre sexta e domingo, alguns empreendimentos já respiram mais aliviados com demandas familiares, mas os números durante a semana ainda são preocupantes.

Ao mesmo tempo em que boa parte dos turistas ainda se mostre receosa em retomar a rotina de viagens, o isolamento social oriundo das medidas restritivas impostas por estados e municípios realçou na população o desejo de viajar. Levantamento da Hotéis.com, por exemplo, mostra que 70% dos brasileiros valoriza a retomada desse hábito. Talvez em um reflexo direto disso, o índice de hotéis abertos disparou para 69% nos últimos 30 dias, aponta estudo divulgado hoje (31) pelo FOHB (Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil).

Perdas de receita, redução da diária média e adequação a novos procedimentos. Apesar da grande expectativa para a retomada, os riscos e questionamentos ainda são grandes. Segundo pesquisa promovida pelo FOHI (Fórum Online de Hotéis Independentes), entre os principais pontos de atenção, as baixas ocupações ainda lideram o ranking do que faz os hoteleiros perderem o sono, com 41%, seguida pela queda de faturamento, de 22%.

Diante do cenário, ações estratégicas não podem abrir espaço para erro. Para entender como empreendimentos de lazer podem aproveitar a vontade do turista de viajar não só aos finais de semana, o Hotelier News conversou com os consultores Daniel Guijarro e Ricardo Aly, que deram dicas para elevar as ocupações. “Havia muita expectativa durante a pandemia e acredito que ninguém foi assertivo no turismo, principalmente na hotelaria. Cada meio de hospedagem tem suas dificuldades particulares. Estamos todos na mesma tempestade, mas não no mesmo barco”, analisa Aly.

Para o consultor, não entrar em guerras tarifárias é ponto de partida para obter melhores resultados, mas sempre lembrando da sazonalidade de cada mercado. “Sem demanda, baixar o preço é o contrário de tudo que aplicamos em consultoria hoteleira. Em resorts no Nordeste, por exemplo, julho chega a ter alguma ocupação, mas quem se destaca mesmo são os destinos de inverno. Todos esses fatores precisam ser levados em conta”, ressalta.

Argumento que é confirmado por Guijarro, que complementa o agravante do calendário escolar alterado pela pandemia. “Historicamente, julho é baixa temporada para destinos de praia. Isso não mudou, só foi agravado em 2020. Antes mesmo da pandemia, as promoções não geravam muito resultado pela característica dos empreendimentos. Não tivemos férias escolares e pessoas que estão no mercado de trabalho, mas não puderam aproveitar”, explica.

 ocupação - ricardo alyAly: as pessoas estão buscando por experiências e estão dispostas a pagar mais por isso

Ocupação: clientes fidelizados e RM

Como muito já foi dito, o turismo doméstico é a grande aposta de 11 entre 10 hoteleiros, em especial o regional, com distância de até 200 quilômetros – e sem transporte aéreo. Para Aly, se antes o RM (Revenue Management) era uma ferramenta relevante, agora se tornou questão de sobrevivência. “O primeiro nicho que pegamos nas análises do CRM são os heavy users. Ou seja, o primeiro passo é avaliar dados e fazer um levantamento desses clientes e, a partir disso, fazer uma campanha promocional nos canais de venda direta para trazê-los de volta. É preciso separá-los dos demais, pois são os melhores hóspedes”, ensina.

A base de clientes fidelizados é também ponto de destaque na fala de Guijarro. “Quem está melhor agora é quem fez um trabalho bem feito em cima dessa gama de clientes e temos exemplos bons de muitos resorts nordestinos. São hóspedes que muitas vezes têm uma ligação emocional com o produto, que os filhos gostam de ir. Hoje, eles estão colhendo os frutos disso”, analisa. “E quando falo sobre trabalhar essa base, não é só em alta temporada e Réveillon, mas pensando em cinco ou 10 anos”.

O princípio do RM é o cliente certo no tempo certo, e o maior prejuízo é não olhar tais detalhes. De forma estratégica, é o momento de analisar dados, mesmo que os tempos sejam outros. “O que não dá é fazer uma miscelânea de promoções. Além de ações voltadas aos clientes fidelizados, aconselho desenvolver uma segunda campanha para o restante do mercado que trafegue em todos os canais de vendas. É momento de avaliar alternativas”, afirma Aly.

Apesar da resistência de muitos hoteleiros em apostarem em OTAs por medo de comissões, Guijarro afirma que o setor não está em posição de recusar nenhum tipo de demanda. “Nunca enxerguei esses canais de forma negativa. É preciso ver o que vale a pena. Eles também estão sentindo os impactos da pandemia e devemos revisar os valores, pois a demanda diminuiu e o produto precisa sobreviver”, acredita.

“Sou sempre favorável a ter parceiros. Muitos clientes vêm por agências de viagens e precisamos utilizar todas as ferramentas possíveis, sejam elas pagas ou não. As OTAs precisam ser trabalhadas com força também”, complementa Aly.

Personalização e experiências

Mesmo antes da pandemia, a oferta de experiências e personalização de hospedagens já era tendência. Com o isolamento social, o desejo do turista por ações que agreguem valor aumentaram ainda mais. “As pessoas estão buscando por experiências e estão dispostas a pagar mais por isso. O e-commerce precisa ser menos burocrático e mais atrativo. Já in loco, oferecer uma hospedagem com um diferencial individual, pois coletivamente existem restrições como um bom room service ou jantares temáticos. São valores que vão se agregando ao tíquete médio”, salienta Aly.

O consultor ainda explica que a recepção também precisa fazer o seu papel, tanto como motor de reservas, quanto como o primeiro contato do cliente dentro do empreendimento. “A recepção precisa ser uma turbina de vendas. Muitos hotéis relaxam nesse aspecto. No lazer, o papel é ainda maior, pois também funciona como uma fonte de informações. Uma sugestão é fazer campanhas de incentivo para as equipes se engajarem a vender”, diz. “E lembrar também que, mesmo em tempos de pandemia, receber o cliente com um sorriso e álcool em gel na mão não é uma experiência”.

Aly ainda lembra que o segmento de lazer tem muitas vertentes, como a melhor idade, e destaca que o uso da tecnologia não pode substituir a hospitalidade dos colaboradores. “A experiência não pode ser algo robótico com o aumento do uso de apps dentro do hotel. O brasileiro não está habituado a marcar horário e reservar atrações. Não dá pra suprir a falta de confraternização pela tela de um celular”.

A palavra de ordem da vez é flexibilização e, para Guijarro, ela é parte essencial da experiência do hóspede. “Ser flexível pode ter o poder de fechar uma venda direta. Pode parecer corriqueiro, mas incluir uma refeição a mais na pensão, por exemplo, é um valor agregado. Da mesma forma que oferecer a transferência de crédito para outra data, negociar prazos ou parcelar a reserva em um número que seja confortável para o cliente”, finaliza.

(*) Crédito da capa: Peter Kutuchian/Hotelier News

(**) Crédito da foto Daniel: Arquivo pessoal

(***) Crédito da foto Ricardo: Arquivo pessoal